terça-feira, 6 de maio de 2008

Guarda Única traz Prejuízos ao Desenvolvimento da Criança.

Guarda única traz prejuízos ao desenvolvimento da criança Autora: Érika Fabíola Silva Gomes* Com a separação do casal, via de regra, a guarda material e legal do menor começa a ser disputada entre os pais, embora se concretizem, é verdade, soluções consensuais sobre a guarda, sem maiores traumas para a criança. Entretanto, não sendo consensual um acordo a respeito da guarda do filho, ao juiz competirá decidir sobre o destino do menor, incumbindo-lhe direcionar todos os esforços no esclarecimento de qual será a forma adequada de atender aos melhores interesses do menor, de forma que não se permita que sobre estes recaiam as desavenças paternas. Ocorre que, em nosso país, o modelo de guarda previsto legalmente é o da guarda única, em que se defere a um genitor o poder familiar e a guarda material (a imediatidade física) da criança, enquanto ao outro genitor, apesar de detentor do poder familiar, incumbe apenas o papel de supervisor da criação do filho, com direito à visitação, e sem qualquer poder de decisão. Neste contexto é que a guarda compartilhada comparece no panorama jurídico, sobretudo em pesquisas doutrinárias e recentes decisões jurisprudenciais, através de sistemas interpretativos das normas constitucional e infraconstitucional, demonstrando uma tendência já alastrada no Direito Comparado de que a guarda única e exclusiva a um dos pais traz prejuízos irreversíveis ao desenvolvimento cognitivo, psíquico e emocional da criança. Trata-se do paulatino reconhecimento de que a ruptura do vínculo conjugal não implica na ruptura do vínculo parental, o qual não se extingue com a separação ou divórcio. Assim, os pais, desunidos no matrimônio, se unem na co-responsabilidade parental da criança, em igualdade de condições, atentos, por um lado, ao melhor interesse dos filhos e, por outro, à igualdade do pai e da mãe no exercício do poder familiar. Tal modelo tomou maior espaço na medida em que o monopólio da guarda a um dos pais concretizou seqüelas das mais variadas e injustas ao menor, ao mesmo tempo em que o reconhecimento da igualdade entre homem e mulher, com o passar dos anos, acabou por incompatibilizar-se com o papel até então privilegiado da mãe como guardiã dos menores (a propósito, leia-se o artigo 10, parágrafo 1º da Lei 6.515/77 e artigo 16 do Decreto-Lei 3.200/41). No intuito de equilibrar estes papéis, e acompanhando o princípio da isonomia consagrado pela Constituição Federal (parágrafo 5º do artigo 226 e inciso I do artigo 5º), o novo Código Civil trouxe ao seu corpo a redação do artigo 1.584, onde se lê: “decretada a separação judicial ou o divórcio, sem que haja entre as partes acordo quanto à guarda dos filhos, será ela atribuída a quem revelar melhores condições para exercê-la.” Não obstante tal alteração legislativa, ainda aí não se demonstra clara a solução para a guarda dos filhos, porque dependente de critérios subjetivos. Todavia, é perfeitamente possível se apresentar a guarda compartilhada como modelo adequado ao nosso ordenamento, mediante interpretação da Constituição, a qual não veda, ao revés, estimula soluções que atendam a um princípio maior, que é o do melhor interesse da criança, como se pode extrair da leitura do artigo 227, ao assegurar, com absoluta prioridade, o direito da criança à convivência familiar, ou do artigo 229, onde se verifica a imposição legal da assistência, criação e educação dos filhos menores pelos pais (imposição esta que se repete no artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente). E se não bastasse a licença de tais dispositivos para aplicação da guarda compartilhada, há ainda disposições na Lei do Divórcio e no novo Código Civil que autorizam tal raciocínio. Leia-se, a propósito, o artigo 9º da Lei 6.515/77 e o artigo 1.583 do CC/02, os quais dispõem que na dissolução de sociedade ou do vínculo conjugal (seja pela separação judicial consensual ou pelo divórcio direto consensual), será observado o que os cônjuges pactuarem quanto à guarda dos filhos. Por outro lado, o artigo 13 da Lei 6.515/77 e o artigo 1.584 do CC/06 dispõem que, havendo motivos graves, poderá o juiz, em qualquer caso, a bem dos filhos, regular de maneira diferente da estabelecida nos artigos antecedentes a situação deles para com os pais. Isto quer dizer que, em atendimento precípuo aos interesses do menor, pode o juiz determinar outra forma de guarda que não a acordada ou, em caso de desacordo, a que se demonstre melhor ao interesse da criança. Aí reside um ponto de divergência no estudo do tema, porque, para alguns juristas, apenas e tão-somente nos casos de separação ou divórcio consensual cabe aplicar o modelo da guarda compartilhada, já que o conflito entre os pais não permitiria a mútua colaboração na formação dos filhos. Trata-se, aliás, de entendimento espelhado no Projeto de Lei 6.315/02, para o qual a guarda compartilhada se aplica apenas para as separações ou divórcios consensuais. Adotamos a linha mais abrangente, já confortada no Projeto de Lei 6.350/02, do deputado licenciado Tilden Santiago (PT-MG), ao propor a guarda compartilhada sempre que esta se mostrar possível (ressalvando o compartilhamento, portanto, naquelas situações em que a litigiosidade dos pais inviabiliza totalmente a co-responsabilidade pela formação dos filhos). Assim, é possível concluir que, embora não exista norma expressa no Direito pátrio a contemplar a guarda compartilhada, ela pode ocorrer por mútuo consentimento dos pais, através de separação ou divórcio consensual, ou ainda, por recomendação judicial, nas separações ou divórcios litigiosos, analisados primordialmente os interesses do menor, mas atentando também para a vontade dos pais, que não podem ser absolutamente beligerantes entre si, característica incompatível com este modelo. Como viabilizar a guarda compartilhada de forma satisfatória em uma separação litigiosa? Nestes casos, o juiz deve estar apoiado não apenas no exame pessoal das circunstâncias do caso concreto, mas igualmente nos estudos realizados por uma equipe de profissionais colaboradores (assistentes sociais, pedagogos, psicólogos, médicos etc.), os quais examinarão não apenas a criança, mas a relação existente entre ela e seus pais, e de cada um dos indivíduos dessa relação separadamente, com o que se poderá chegar, a contento, a uma conclusão segura pela guarda compartilhada da criança, porque o objetivo maior deste modelo é a manutenção do vínculo entre pais e filhos e não a exposição do menor ao conflito parental dos cônjuges. Em síntese, é possível a determinação da guarda compartilhada tanto nas separações consensuais como naquelas onde houver litígio, desde que o ambiente familiar se mostre propício a esta solução, de modo a atender ao melhor interesse da criança. Revista Consultor Jurídico, 4 de agosto de 2006 Autora: Érika Fabíola Silva Gomes: é especialista em Direito de Família de Franco, Kelly, Mattei & Advogados Associados. Fonte: http://conjur.estadao.com.br/static/text/46982,1

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