sexta-feira, 3 de junho de 2011

Filhos de pais divorciados manifestam dificuldades para se relacionar e aprender matemática, indica estudo

RIO - Uma pesquisa realizada nos Estados Unidos mostra que, ao contrário do que muitos acreditam, filhos de pais separados geralmente não apresentam problemas de aprendizado ou de comportamento no período pré-divórcio. Por outro lado, eles costumam manifestar dificuldades em matemática e para se relacionar durante o processo do divórcio.

O estudo também revela, no ensaio de junho do American Sociological Review, que crianças cujos pais são divorciados são mais propensas a sofrer de ansiedade, solidão, baixa autoestima e tristeza. Esse aumento da "internalização dos problemas de comportamento" também começa no processo do divórcio e não se dissipa.

- As pessoas tendem a pensar que os casais passam por intensos conflitos conjugais antes de decidirem se separar - disse o autor do estudo Hyun Sik Kim, da Universidade de Wisconsin-Madison. - Minhas previsões originais eram de que filhos de pais separados vivem impactos negativos mesmo antes de o processo do divórcio formal começar. Mas meu estudo mostra que este não é o caso.

Kim percebeu que as crianças passaram a apresentar problemas de desenvolvimento depois que seus pais começaram o processo do divórcio, e essas questões continuaram a perseguí-los mesmo depois que esse período termina.

- Esse estudo revela que esses impactos negativos não pioram na etapa pós-divórcio, assim como não há sinais de que filhos de pais separados reproduzem tal comportamento com seus parceiros - disse ele.

Baseando-se em dados nacionais representativos, o estudo traça o desenvolvimento de 3585 crianças do momento em que entraram no jardim de infância até a quinta série, e compara as informações de crianças cujos pais são separados com aquelas com pais casados. Uma característica única do estudo é que ela foca nos casos de separação que ocorrem quando as crianças estão entre a primeira e a terceira séries, o que capacita Kim de examinar os efeitos do divórcio durante três etapas separadas: pré-divórcio (jardim de infância à primeira série), durante o divórcio (primeira a terceira séries) e pós-divórcio (terceira à quinta séries).

Segundo Kim, há muitas razões por que crianças cujos pais são divorciados ou a família está neste processo passariam por problemas.

- Esses fatores podem incluir o estresse que as crianças vivem como resultado de ver seus pais culpando um ao outro pelo divórcio ou argumentando sobre a custódia; uma situação instável, na qual a criança é levada de uma casa a outra ou são obrigadas a mudar para outro local com o responsável que recebeu a custódia, desfazendo suas relações sociais; dificuldade econômica devido a uma diminuição repentina na renda familiar; e efeitos residuais de uma depressão de um dos pais por causa do divórcio - explica Kim.

Enquanto o divórcio tem efeitos adversos no rendimento em matemática e relações pessoais, além de comportamentais, em geral, filhos de pais separados não vivem impactos negativos em suas habilidades de leitura ou têm dificuldade em externar seus problemas de comportamento, o que indicam que geralmente eles argumentam, discutem ou ficam com raiva.

Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/vivermelhor/mulher/mat/2011/06/02/filhos-de-pais-divorciados-manifestam-dificuldades-para-se-relacionar-aprender-matematica-indica-estudo-924590070.asp#ixzz1OEGld7JZ
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sexta-feira, 25 de março de 2011

Sentença do caso David/Sean Goldman na íntegra, para conhecimento

I - RELATÓRIO:
Trata-se de ação de busca, apreensão e restituição de menor, ajuizada
pela UNIÃO FEDERAL em face de JOÃO PAULO BAGUEIRA LEAL LINS E SILVA, no contexto de cooperação jurídica internacional, com esteio na Convenção
da Haia de 1980, sobre os Aspectos Civis do Seqüestro Internacional de Crianças,introduzida no ordenamento jurídico brasileiro por meio do Decreto n.o 3.413!~OOO~'
De acordo com a petição inicial, a criança cuja restituição setbJc~,
SEAN RICHARD GOLDMAN, atualmente com 9 (nove) anos de idade, recémcompletados, é filho da brasileira BRUNA BIANCHI CARNEIRO RIBEIRO com o cidadão estadunidense DAVID GEORGE GOLDMAN, e possuiu residência habitual nos Estados Unidos da América desde seu nascimento, em maio de 2000, até o ano de 2004, período em que conviveu com ambos os genitores, uma vez que ainda eram casados.

Aos 16/06/2004, a criança veio ao Brasil, acompanhada da mãe, com
autorização do pai, para visita temporária, com data de regresso previamente agendada para o dia 11/07/2004, sendo que o retorno deveria ocorrer, no máximo, até o dia 18/07/2004.
No entanto, a mãe do menor decidiu permanecer no Brasil, de forma
unilateral, o que teria caracterizado violação do direito de guarda estipulado na mencionada Convenção, e ainda conforme a legislação material aplicável, segundo esse mesmo tratado, qual seja, a lei do Estado da Nova Jérsei, EUA.
Sempre nos termos da peça inicial, aduziu a União ter havido a
propositura de uma anterior ação semelhante à presente, movida pelo próprio pai do menor, SI. DAVID GOLDMAN, em face da mãe, Sra. BRUNA BIANCHI, demanda essa cujo pedido foi julgado improcedente, em primeiro e segundo graus de jurisdição, ao fundamento, em suma, de que, não obstante a ilicitude da retenção do menor, o tempo decorrido entre sua transferência e o julgamento da ação foi suficiente para caracterizar a adaptação do menino ao Brasil, de modo a ensejar possível dano psíquico em caso de retorno aos EUA, sem a companhia da mãe.
Houve, ainda, a interposição de Recurso Especial, ao Eg. Superior
Tribunal de Justiça, sendo, porém, negado provimento ao mesmo. Tal processo, quando do ajuizamento desta nova ação, aguardava julgamento de Agravo de Instrumento, interposto pelo SI. DAVID GOLDMAN, perante o Eg. Supremo Tribunal Federal, contra despacho que negara seguimento a Recurso Extraordinário.
Paralelamente a essa anterior demanda de busca e apreensão da criança, o Juízo de Direito a 2ª Vara de Família da comarca do Rio de Janeiro
processou e Julgou açao de guarda, movida pela mãe do menor, no bojo da qual foi julgado procedente o pedido para lhe conceder, de forma exclusiva, a guarda do filho.
Ocorre que, aos 22/08/2008, a mãe de SEAN,Sra. BRUNA BIANCHI,que havia contraído novo casamento com o ora Réu, SI. JOÃo PAULO LINS E SILVA,
lamentavelmente veio a falecer, por ocasião do parto de uma filha dessa nova união.
Ao saber desse trágico episódio, o pai do menor veio ao Brasil, a fim de
reaver a guarda de seu filho, sendo-lhe, contudo, vedado acesso à criança, pelo ora Réu, que chegou a ajuizar outra ação judicial, perante a Justiça do Estado do Rio de Janeiro, desta feita visando ao reconhecimento de paternidade sócio-afetiva, em relação a esse mesmo menino, cumulada com posse e guarda da criança, além da conseqüente destituição do pai biológico da relação de poder familiar, inclusive com
alteração dos nomes do pai e dos avós paternos, constantes da certidão de
nascimento de SEAN.
Diante de tal situação, o Sr. DAVID GOLDMAN requereu a intervenção
da Autoridade Central estadunidense, dada a retenção indevida de criança por pessoa não detentora do direito de guarda, a partir do que foi encaminhado ao Estado brasileiro o pedido de cooperação inter-jurisdicional, a fim de se providenciar a devolução do menor ao então país de residência habitual, de modo a retornar aos cuidados de seu pai.
Colocados os fatos nesses termos, formulou a União os seguintes
pedidos, como provimento de mérito:...
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terça-feira, 22 de março de 2011

Ministério Público protege criança contra alienação parental

Em sua exposição sobre o tema “Da Alienação Parental ao Abuso Sexual”, durante o I Seminário sobre alienação parental e o divórcio com seus reflexos da EC nº 66/2010, a advogada e mestre na área de Direito de Família e Sucessões e membro do Instituto Brasileiro de Direito de família (IBDFAM), Mônica Guazzelli, buscou, na manhã da última 6a.feira (18/03), na tragédia grega de Eurípedes, “Jasão e Medeia”, datada de 431 a.C. a ideia de retaliação e vingança que pode causar o fim da relação parental.

Tais elementos revelam a atualidade da alienação parental na vida cotidiana, em que a separação mal resolvida dos cônjuges pode causar aos filhos graves conflitos psicológicos.

O assunto vem à baila, no mundo jurídico, a partir da vigência da Emenda Constitucional nº 66, de 13 de julho de 2010, dá nova redação ao § 6º do art. 226 da Constituição Federal, que dispõe sobre a dissolubilidade do casamento civil pelo divórcio, suprimindo o requisito de prévia separação judicial por mais de um ano ou de comprovada separação de fato por mais de dois anos.

A abertura do evento foi proferida pela procuradora Geral de Justiça, Maria do Perpétuo Socorro França Pinto, que apresentou a palestrante.”É importante que possamos refletir sobre o que diz a nova legislação, mas não nos esqueçamos do amor e da família, que alimentam a nossa vida como seres humanos. Nunca o mundo precisou tanto do desenvolvimento humano” - enfatizou.

A avaliação do estado psicológico da criança deve se dar por uma equipe multidisciplinar, tratando-se de um fenômeno subjetivo estudado pela psicologia e pelo direito, conforme o art. 2º, da Lei nº 12.318, citado pela palestrante.

Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.

O dispositivo observa serem formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros: realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade; dificultar o exercício da autoridade parental; dificultar contato de criança ou adolescente com genitor; dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar; omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço; apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente; mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.

Segundo Mônica Guazzelli, a alienação parental é o conjunto de sintomas que gera o sentimento de retaliação e permite o sepultamento afetivo de um genitor, motivado pela violência psicológica provocada pelo outro genitor, quando de uma separação traumática.

Isto implica em corte temporário ou permanente de laços que podem tornar um dos pais inexistente para a prole e esta órfã de pai ou de mãe viva.

De acordo com a advogada, a síndrome da alienação parental não é uma questão de gênero, passando a criança a se identificar com o genitor alienador de maneira patológica.

Assim, ela aceita como verdadeiro tudo o que este lhe informa, até mesmo falsas acusações contra o outro genitor, por meio de estratégias, como: o distanciamento pelo boicote do convívio; a desmoralização do outro com críticas e desqualificação; a internalização do sentimento de culpa na própria criança; e a competição financeira entre os genitores com a finalidade de conquistar a criança por meio de bens materiais.

Existem três níveis de classificação da síndrome da alienação parental, sendo identificados na criança a agressividade; o sentimento de ódio expresso sem ambivalência; a afirmação de que chegou sozinha às suas conclusões; a defesa do genitor alienador; a narração de fatos negativos, mas que não aconteceram, resultantes de lavagem cerebral e implantação de falsas denúncias.

A promotora de Justiça de Família, Ana Cláudia Uchoa de Albuquerque Carneiro, afirmou que a matéria trata, sobretudo, de afetividade, disse, ao confirmar que, diariamente, há, pelo menos, um caso de alienação parental em sua área de atuação.

“Uma criança que não quer ver um dos pais não pode estar bem”. Ela defendeu a tese de haver uma Vara exclusiva para este tipo de situação.

“Em caso de dúvida, não se pode suspender as visitas do genitor não garantidor. Caso não haja o consenso entre os pais, deve haver a guarda compartilhada para tirar a ditadura do guardião” - entende.

A defensora pública Elizabeth Chagas lembrou que nem sempre é a mulher quem pratica a alienação parental. Ela considerou o perigo de o Judiciário não perceber que o não guardião também pode cometer a alienação parental.

Fonte: http://www.direitoce.com.br/noticias/48235/.html

sexta-feira, 11 de março de 2011

Alienação parental

Autor: Elizandra Souza

Termo pouco conhecido até entre psicólogos, professores e advogados, vem merecendo destaque por causa de sua prática bastante comum. Alguns especialistas utilizam também o termo síndrome para falar da alienação parental, pois consideram que o conjunto de sintomas que surgem nesta prática é patológico. Apesar de não ser um fenômeno novo, hoje desperta maior atenção, principalmente pelo grande número de divórcios e ampliação das questões relacionadas a guarda dos filhos.

Segundo Richard Gardner, norte-americano, que, em 1985 nomeou o sintoma, a síndrome de alienação parental existe quando após a separação, um dos genitores influencie a criança a não gostar mais do outro genitor. Em casos mais graves há até sugestão de abusos sexuais e violência física. O genitor alienador faz com que a criança diga sobre coisas que não sofreu, mas que foi induzida a acreditar que era verdade. O que acontece é uma programação para que o filho se afaste do genitor alienado e volte-se totalmente para o genitor alienador. O filho é usado como forma de agredir o antigo parceiro.

Os discursos alienantes podem acontecer de forma sutil ou explosiva, mas são sempre insistente, assertivos e repetidos. Desta maneira, o trabalho de advogados, médicos, psicanalistas e psicólogos é dificultado, pois gera dúvida em relação ao genitor que sofre as acusações, sem conseguir saber, de imediato, ele realmente causa mal ao filho ou se o filho sofre alienação.

Apesar de, na maioria das vezes, a síndrome de alienação parental ocorrer entre ex-cônjuges, ela também pode se apresentar com relação a avós e pais (ou outros parentes). Isto, pelo fato de envolver disputa judicial ou mesmo, somente, disputa do amor da criança (ou do adolescente). Um quer ser mais amado pela criança e quer que o outro se afaste, pois tem medo de perder o amor e a atenção da criança.

O alienador leva a criança a acreditar que o outro não é uma boa pessoa, que fez ou faz maldade, que o outro não gosta dela. Muitas vezes também, o alienador se coloca numa posição vitimizada, onde o ouro é culpado de toda a infelicidade que vive é causada pelo outro.

Aquele que sofre a alienação, independente da idade, se sente muito mal com esta situação e passa a ficar confuso, muitas vezes sem saber se as coisas que o alienador fala é verdade ou mentira ou se a situação em que está é realmente culpa do outro ou não.

O filho aos poucos se afasta do genitor alienado, em função daquilo que o alienador diz sobre o outro. Muitas vezes, o filho se sente mal em estar com o outro, pois sabe que este será desmoralizado. O genitor alienador faz com que os vínculos sejam destruídos. Em muitos casos se colocam na posição de vítimas e manipulam os filhos para acreditar que todas as coisas ruins que acontecem são culpa do genitor alienado.

Preso a contradições de sentimentos e discursos incisivos, os filhos sentem efetivamente a manipulação a acabam concordando com tudo o que é informado sobre o outro. Esta alienação vai desde dizer que o outro não gosta do filho ou que não desejava ter filhos até possíveis abusos sexuais.

Nem sempre o filho, que sofre esta alienação, consegue discernir sobre o verdadeiro e o falso, nem mesmo sobre a manipulação sofrida e, por isso, fica convencido do que foi dito e é levado a repetir como verdade absoluta.

Um exemplo disto é quando a mulher que está separada passa a dizer para o filho que o pai era ruim, que nunca gostou dos filhos, que só se preocupava com ele, que vai fazer todo mundo passar necessidade, que vai abandonar os filhos. Existem caos em que a criança ou adolescente se sente mal em sair com o outro genitor, quase não conversa e quando volta para casa diz que o passeio foi péssimo, mesmo que tenha sido bom.

A alienação parental pode ocorrer de ambos os lados. O que vai defini-la é a manipulação afetiva que um exerce sobre a criança ou adolescente com o intuito de influenciar negativamente sobre o outro. Enquanto síndrome, condiciona aquele que sofre a formar ações, sentimentos, pensamentos e comportamentos contra o outro (o alienado).

Alguns sintomas podem ser observados para pensar numa síndrome (chamada assim pelo número de sintomas que podem surgir, em geral sem ligação) de alienação parental: afastamento do genitor alienado com justificativas fracas; desculpas tolas para a não visitação ou passeios com o genitor alienado; dizer que a compania do genitor alienado não é boa ou que o passeio foi ruim, que fez por obrigação – isto só para não deixar que o genitor alienador se sinta mal ou inferiorizado; o filho apresenta falta de atenção nos estudos; demandam amor e atenção de forma desvirtuada (com coisas erradas); se recusam a seguir normas e regras; defendem a todo custo o genitor alienador, às vezes, sem saber por quê; os filhos sentem dó do genitor alienador; os filhos não sentem culpa quando existe abuso, agressividade ou injustiça com o outro genitor. Asim como apresentam timidez, porém com inquietação, medo, insegurança, um certo sentido de robotização (a criança parece não ser ela mesma).

A alienação parental pode acontecer em qualquer idade, pois as formas de manipulação ou doutrinação são diversas e atigem, principalmente, pelo apelo emocional. Infelizmente o alienador não consegue mensurar os danos psíquicos, emocionais e sociais que pode causar na criança ou no adolescente. E muitas vezes, está num conflito tão grande que não consegur perceber o que está fazendo ou dizendo e ataca o outro utilizando como arma somente o filho, acreditando que o amor da criança e o mal-estar do outro vai lhe trazer satisfação.

Elizandra R. Souza

Psicanalista

http://www.artigonal.com/psicoterapia-artigos/alienacao-parental-4315987.html

Perfil do Autor

Psicanalista, Professora de cursos de Formação em Psicanálise, Diretora da Comissão de Ética do SINPESP (Sindicato dos Psicanalistas do Estado de São Paulo), escreveu o livro "Apriximando-se da Psicanálise num jogo de perguntas e respostas".

segunda-feira, 7 de março de 2011

O toque de recolher e o direito infanto-juvenil

Aniêgela Sampaio Clarindo

Em algumas comarcas brasileiras juízes das varas de infância e juventude têm instituído através de portarias o "toque de recolher". O termo significa a limitação da circulação de crianças e adolescentes pelas vias públicas e em estabelecimentos até certo horário da noite. A partir de então necessitam fazê-lo acompanhados de um maior responsável. A simples emissão de uma portaria não significa extrapolar competência. Os membros do Poder Judiciário possuem uma parcela de capacidade para legislar que é permitida pelo ordenamento brasileiro. O art. 149 da Lei nº 8.069/90 (ECA) lista hipóteses nas quais o magistrado pode disciplinar situações que envolvam menores de idade através de portarias e alvarás. Permite-se a limitação do direito de ir e vir com vistas à proteção da saúde física e psíquica dos menores. A polêmica reside no fato de que o artigo não acrescenta a situação correspondente ao "toque". A corrente contrária defende a ilegalidade da medida pela ausência de previsão. O direito de livre locomoção, sendo fundamental, não pode ser restringido fora das hipóteses elencadas em lei. O juiz poderia decretar o "toque" na vigência do antigo Código de Menores porque possuía um poder normativo cuja decisão prescindia de fundamentação. O "toque" é uma tentativa de substituir as necessárias atuações dos Poderes Legislativo e Executivo, bem como da família e da sociedade em conjunto. Os que desejam a manutenção das portarias lembram que o ECA institui o princípio da prevenção. Deve-se zelar pelo saudável desenvolvimento de crianças e adolescentes prevenindo sua exposição a situações de risco. O próprio ECA elenca hipóteses de limitação do direito de ir e vir com esta finalidade. A interpretação do art. 149 tem de ser sistêmica, levando-se em conta a relação deste dispositivo com todos os princípios da lei. O juiz pode decretar o "toque" fundamentando-o. Para isso deve ouvir a comunidade e os órgãos de proteção ao menor. Respeitando o devido processo legal e apresentando-se um aparato estatal satisfatório para a vigilância, a medida pode vigorar. Em todo caso o menor deve ser abordado e encaminhado aos pais conforme os ditames do ECA. Conclui-se pela legalidade da medida preventiva, a ser decretada e aplicada em consonância com os requisitos expostos. A temática é interessante por abordar a limitação a um direito fundamental infanto-juvenil. A metodologia consiste em levantamento bibliográfico, abrangendo a legislação, artigos de doutrina e notícias de jornais, em fontes impressas e na internet.


INTRODUÇÃO


Ao Poder Judiciário está reservada parcela de competência legislativa, a ser exercida nos casos expressamente já expostos em lei. Um exemplo disto seria a função que o juiz da vara de infância e juventude possui de emitir portarias e alvarás, em conformidade com o art. 149 do ECA. Este dispositivo considera as hipóteses nas quais o magistrado disciplinará a entrada e a permanência de crianças e adolescentes em determinados lugares, atendendo-se, em contrapartida, a uma série de requisitos, também elencados pelo dispositivo. Dois destes requisitos são: o atendimento aos princípios da Lei nº 8.069/90, as peculiaridades locais e a fundamentação constante no ato normativo decretado.

Justificando sua postura, sobretudo, nos apelos da comunidade e na efetivação do princípio da prevenção, alguns magistrados têm decretado em portarias a limitação de horários para que infantes e jovens circulem sozinhos, à noite, pelas vias públicas e em determinados estabelecimentos. As medidas encontraram resistência no meio jurídico, sob os argumentos de que o ECA não elenca a possibilidade da instituição de uma espécie de "toque de recolher" e também no fato de que o juiz estaria confundindo seu papel atua com o extinto poder normativo do juiz de menores.

O presente trabalho abordará a polêmica, iniciando pela breve explicação da função legislativa que remanesce ao judiciário, passando em seguida à exposição dos fundamentos das correntes contra e em prol do "toque". A relevância da temática é inconteste, pela abordagem de princípios norteadores do direito infanto-juvenil em relação ao direito de livre comoção, questionando-se os limites que podem ser impostos a este último em nome da proteção integral. Realizou-se pesquisa bibliográfica, que abrangeu consulta a artigos científicos e reportagens jornalísticas disponíveis em fonte impressa e em meio eletrônico (internet), além da legislação pertinente.

A FUNÇÃO LEGISLATIVA QUE CABE AOS JUÍZES DAS VARAS DE INFÂNCIA E JUVENTUDE


O princípio da separação dos poderes à primeira vista consagra a divisão de funções entre o legislativo, o executivo e o judiciário de modo que não haja interpenetrações entre as três esferas de poder. Somente uma delas, aparentemente, exerceria a atividade legiferante, incluindo-se toda a sorte de atos normativos. O estudo da ciência jurídica, contudo, revela a inexistência de regras às quais não possam ser aplicadas, eventualmente, exceções. Embora o art. 2º da CF/88 consagre que o legislativo, o executivo e o judiciário são "harmônicos e independentes", o termo independência não corresponde à completa distância, havendo a possibilidade de que os poderes se limitem reciprocamente. Isto ocorre através da cooperação entre os órgãos especializados e o inter-relacionamento das atividades por eles desenvolvidas para que o "poder limite o poder", no chamado sistema de "freios e contrapesos" (GABRIEL, 2009).

A legislação infraconstitucional, após o advento da CF/88 passou a balizar a parcela de atividade legislativa que coube ao judiciário e ao executivo, especificando as situações nas quais isto é cabível, e o procedimento para que fossem válidos os atos normativos não oriundos do legislativo. Atendendo à proposta deste trabalho, será a abordagem restrita à competência do judiciário concernente à confecção dos atos referidos, no âmbito da justiça especializada na infância e juventude.

O art. 149 da lei nº 8.069/90 determina:
Art. 149 - Compete à autoridade judiciária disciplinar, através de portaria, ou autorizar, mediante alvará:

I - a entrada e permanência de criança ou adolescente, desacompanhado dos pais ou responsável, em:

a) estádio, ginásio e campo desportivo;
b) bailes ou promoções dançantes;
c) boate ou congêneres;
d) casa que explore comercialmente diversões eletrônicas;
e) estúdios cinematográficos, de teatro, rádio e televisão;
II - a participação de criança e adolescente em:
a) espetáculos públicos e seus ensaios;
b) certames de beleza

Esta espécie de função que o magistrado possui é denominada anômala, por escapar das atribuições inerentes à atividade judicante. A portaria e o alvará são instrumentos que possibilitam a regulamentação mais esmiuçada de dispositivos legais preexistentes, tendo em vista os graus de abstração e generalização destes. A redação do art. 149 continua, sinalizando os fatores que justificam a expedição de alvarás e portarias:


§ 1º - Para os fins do disposto neste artigo, a autoridade judiciária levará em conta, dentre outros fatores:

a) os princípios desta Lei;
b) as peculiaridades locais;
c) a exigência de instalações adequadas;
d) o tipo de freqüência habitual ao local;
e) a adequação do ambiente a eventual participação ou freqüência de criança e adolescentes;
f) a natureza do espetáculo .

§ 2º - As medidas adoradas na conformidade deste artigo deverão ser fundamentadas, caso a caso, vedadas as determinações de caráter geral .

A validade de portarias e alvarás está condicionada à obediência da regra insculpida nos parágrafos primeiro e segundo do art. 149, não se constituindo em atitude de cunho meramente discricionário. O objetivo desta norma é efetivar, entre outros princípios, o da prevenção, enunciado no art. 70 da lei nº 8069/90: "É dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente". A leitura do dispositivo deve ser realizada em conjunto com a do caput do art. 227 da CF/88:

Art. 227 – É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Ao contrário do que comumente a sociedade conhece a respeito do ECA, a lei menorista não restringe o seu alcance às situações de delinqüência infanto-juvenil, ressaltando, também, a responsabilidade de todos (família, sociedade e Estado) na tomada de medidas preventivas, visando afastar crianças e adolescentes de qualquer situação em que potencialmente possam ter seus direitos lesionados. A função anômala dos juízes da infância e juventude possibilita a tomada destas medidas, no âmbito local (das comarcas).

Situação que tem gerado polêmica é a respeito de haver ou não permissão legal para que o magistrado, através de portaria, convencione restrições à circulação noturna de menores de dezoito anos pelos logradouros públicos, fixando um horário para que isto aconteça sem que seja imprescindível o acompanhamento por um adulto. Isto porque o art. 149 não estipula expressamente este caso, fazendo com que juristas se dividam a respeito da validade de portarias com este teor que já foram editadas em algumas comarcas brasileiras.

O "TOQUE DE RECOLHER" E AS OPINIÕES CONTRÁRIAS


Em cidades do interior de São Paulo foram expedidas pelas varas de justiça da infância e juventude portarias de conteúdo similar, vedando, a partir de determinado horário, a circulação de menores desacompanhados dos pais ou responsáveis. A medida adotada nas cidades de Fernandópolis, Ilha Solteira e Itapura foi taxada pela imprensa como o "toque de recolher", situação que foi imitada no município paraense de Cambará, onde a juíza responsável determinou em portaria a limitação de horários para que menores estivessem desacompanhados em bares, restaurantes e lanchonetes. Além de São Paulo e Paraná, a medida foi decretada em cidades do interior paraibano, a exemplo de Taperoá. Em 2009 já se contabilizavam, ao todo, 21 cidades em oito estados do país onde o "toque" passou a vigorar.

Em todos os casos, os magistrados fundamentam suas decisões no argumento de que a comunidade destas localidades clamava por uma medida urgente que contribuísse para a redução dos casos de atos infracionais e envolvimento de menores com álcool e drogas ilícitas, situações normalmente verificadas após nove ou dez horas da noite.

Em relação aos índices de violência praticada por menores, notícia veiculada no portal eletrônico do jornal O Estadão (SIQUEIRA, 2009) confirma que, após ter sido imposto em maio de 2005, o "toque" ajudou a reduzir em 80% o cometimento de atos infracionais e em 82% o número de reclamações dirigidas ao Conselho Tutelar, na comarca de Fernandópolis. Em 2005, foram 378 ocorrências, contra 329 em 2006; 290 em 2007; e apenas 74 em 2008. A redução também acompanha outras ocorrências, como porte de entorpecentes, de 17 casos para 8; lesão corporal, de 68 em 2005 para apenas 19 em 2008.

Apesar do considerável avanço demonstrado, alguns operadores do direito se opõem rigidamente à edição de portarias que condicionem a certa faixa de horários a circulação de menores de dezoito anos nas ruas. Isto representaria uma violação indevida ao direito de livre locomoção, consoante se encontra insculpido no inciso XV do art. 5º da CF/88:

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XV- À livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens;

A competência disciplinar do juiz da infância e juventude, na medida em que permite limitar o exercício de direitos infanto-juvenis, deverá então restringir-se aos casos expressamente elencados no caput do art. 149 do ECA. Entender que o magistrado poderia expedir portarias e alvarás em outras situações seria um retorno indevido à antiga lei menorista, o Código de Menores da década de setenta, o qual rezava em seu art. 8º:

Art 8º - A autoridade judiciária, além das medidas especiais previstas nesta Lei, poderá, através de portaria ou provimento, determinar outras de ordem geral, que, ao seu prudente arbítrio, se demonstrarem necessárias à assistência, proteção e vigilância ao menor, respondendo por abuso ou desvio de poder.

Tratava-se do extinto poder normativo do juiz de menores, a ser exercido sem parâmetros específicos, em consonância com a Doutrina da Situação Irregular. Na época as crianças e adolescentes não eram vistos como sujeitos de direitos, devendo submissão quase que irrestrita às determinações das autoridades judiciárias e policiais (SILVA, In: CURY, 2006). Desta forma, aceitar que o magistrado a seu bel prazer trace normas de comportamento sem que sua atitude esteja justificada pela Lei nº 8.069/90, cujo espírito é o posto daquele que permeava o anterior Código, significa, contraditoriamente, zelar pelo princípio da prevenção através de uma violação ao próprio texto legal.

Conforme pesquisa do IBGE com dados coletados entre 2000 e 2006, percebe-se que a questão da violência infanto-juvenil é extremamente complexa, não merecendo uma solução de cunho simplista. Em 2009 o referido órgão publicou a pesquisa completa, na qual se constata que o aumento das redes de tráfico de drogas, a ineficácia das políticas públicas, a impunidade e a fragmentação das relações familiares contribuíram para o aumento da violência no Brasil, especialmente dos homicídios nos últimos anos. Os homens jovens, pobres, na faixa de 15 a 29 anos de idade são, ao mesmo tempo, as principais vítimas e os principais agentes da situação que afeta a sociedade de modo geral (GONÇALVES; MAIA, 2009).

Por isso entende-se o motivo pelo qual o princípio da prevenção se efetiva através de ações coordenadas tanto pelo Estado na esfera judiciária, como pela atuação dos poderes executivo e legislativo, não se olvidando, ainda, as participações da família e da comunidade. A adoção do "toque de recolher" é medida que tenta suprir, de maneira desesperada e ineficaz, a ausência de políticas públicas ou a precariedade das que já existem na área infanto-juvenil, a insuficiência dos aparatos de segurança pública e o sentimento de descompromisso em relação à proteção dos direitos infanto-juvenis que ainda permeia grande parte da sociedade (FERREIRA; BATALHA, 2009).

OS ARGUMENTOS EM PROL DO "TOQUE"


Para os que apóiam as medidas tomadas pelos juízes das cidades retro citadas, não vinga o argumento de que o "toque de recolher" significa privação indevida da liberdade de locomoção. Conforme o inciso I do art. 16 do ECA, o direito à liberdade de ir e vir nos logradouros públicos e espaços comunitários não é absoluto, estando seu exercício condicionado à obediência das restrições legais. A título exemplificativo reporte-se ao art. 82 da Lei nº 8.069/90, onde se encontra a proibição de hospedagem de menor em "hotel, motel, pensão ou estabelecimento congênere, salvo se autorizado ou acompanhado pelos pais ou responsável". Percebe-se, assim, que a limitação à liberdade do menor não é exclusivamente imposta por ocasião da aplicação de medidas sócio-educativas, mas sempre que se mostrar imprescindível à proteção integral da criança e do adolescente, tendo em vista sua peculiar condição de seres em desenvolvimento físico e psíquico (ARAÚJO, 2009).

De fato, a redação do inciso V do parágrafo terceiro do art. 227 da CF/88 dá margem a este raciocínio, na medida em que obriga a obediência aos critérios de "brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida privativa da liberdade;". Restringir a livre circulação de crianças e adolescentes deve ser um ato fundamentado, portanto, no respeito ao saudável crescimento infanto-juvenil, tendo em vista as peculiaridades da comunidade na qual o infante e o jovem estejam, por ventura, inseridos.

As portarias que instituem o "toque" não são ilegais porque possuem um caráter preventivo, no sentido de garantir que crianças e adolescentes não sejam expostos a situações de risco, conforme aduz o juiz da comarca de Fernandópolis, Evandro Pelarin (2009). Para ele o elemento preventivo do "toque" é justamente o que não o torna propriamente uma medida de privação da liberdade. O ato de abordar nas ruas meninos e meninas em situação de risco, conduzindo-os para suas casas em seguida, juntamente com recomendação dirigida aos pais ou responsáveis é cumprir o mandamento da proteção integral, garantindo que crianças e adolescentes tenham "desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade" (art. 3.º da Lei nº 8.069/90).

Reza o art. 70 do ECA: "É dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente". A atuação do juiz não pode restringir-se, portanto, aos casos em que já se verifica a violação aos direitos infanto-juvenis; indo mais além, cabe à autoridade judiciária garantir, dentro da sua competência, a maior redução possível da exposição infanto-juvenil a situações que atentem contra o seu saudável crescimento físico e mental.

Aliás, tocando na questão da competência, embora não esteja inserido expressamente no rol do art. 149 do ECA, existe sim a permissão legal para a instituição do toque, tendo-se em conta como a Lei nº 8.069/90 deve ser interpretada. Diz o art. 6º:

Art. 6º - Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.

Não se deve considerar, pois, que a intenção do legislador fosse a de elencar taxativamente as hipóteses em que se permitem a edição de portarias e alvarás, conforme entende Denilson Cardoso de Araújo (2008). A Lei 8.069/90 deve ser submetida a uma interpretação de cunho sistêmico, tendo em vista a própria lógica jurídica de que nenhum dispositivo legal impera sozinho e absoluto, principalmente aqueles referentes ao direito infanto-juvenil, tendo em vista a recorrente relação que se estabelece entre estes e a CF/88. O autor ilustra sua explicação, aludindo à redação do art. 122 do ECA: "A medida de internação só poderá ser aplicada [...]" onde se denota explicitamente a intenção do legislador em enumerar um rol definitivo, o que não ocorre na redação do art. 149.

Reforçando a tese, tem-se o art. 72 determinando: "As obrigações previstas nesta Lei não excluem da prevenção especial outras decorrentes dos princípios por ela adotados." Estaria assim consagrado que a emissão de portarias e alvarás, antes de obedecer a uma lista meramente exemplificativa, deve se dar em acordo com a necessidade de se garantir a proteção integral através de medidas preventivas.

Embora a violência infanto-juvenil e a exposição de menores a situações de risco sejam questões complexas porque envolvem a omissão ou atuação insuficiente não apenas do judiciário, mas sim do Estado como um todo, o "toque de recolher" não significa ignorar a obrigação que os demais poderes possuem, dentro de suas competências. Continuam restando ao executivo e ao legislativo o cumprimento de deveres nos quesitos segurança pública e políticas públicas voltadas para menores de idade.

A emissão de uma portaria semelhante às que estão sendo discutidas neste trabalho deve respeitar o devido processo legal. Consoante o magistrado Evandro Pelarin (2009), não está eivada de ilicitude a determinação judicial que está devidamente fundamentada, conforme manda o art. 149 do ECA. Ilustrando a regra com circunstâncias da sua portaria, o juiz explica o caminho percorrido até a vigência desta: após receber reclamações emanadas de populares e associações de bairro, a partir de uma petição do Ministério Público local, o Poder Judiciário determinou a formação de uma força-tarefa, com a atuação conjunta das Polícias Civil e Militar e do Conselho Tutelar. A OAB foi convidada para fiscalizar as ações desta força-tarefa.

Percebe-se que a instituição do "toque" não representa o exercício do extinto poder normativo do juiz de menores, pois a própria legislação menorista atual impõe a necessidade de fundamentação, quesito este cuja ausência é o que caracterizava um poder quase absoluto e ditatorial nas mãos do antigo juiz de menores.

O magistrado ainda ressalta que o tratamento dado aos infantes e jovens encontrados, altas horas da noite, sozinhos e expostos a situações em que se verificava o consumo de álcool e drogas ilícitas, eram conduzidos em viatura do Conselho Tutelar, sem algemas, de acordo com as diretrizes do ECA. Eram encaminhados aos pais ou responsáveis, que deveriam, por sua vez, assinar um termo de compromisso. Caso o menor fosse novamente flagrado na mesma situação, os responsáveis poderiam ser penalizados consoante os dispositivos do ECA, a exemplo da aplicação de multa. Não se pretende usurpar dos pais a tarefa de educar e vigiar seus filhos menores, e sim colaborar com ela, inclusive conscientizando genitores e responsáveis legais omissos.

Alguns aspectos devem ser considerados, contudo, para que a decretação da medida do "toque" seja viável na prática. É necessário, antes de sua instituição, uma consulta aos órgãos de representação popular, ou diretamente exercida na comunidade, para que se verifique a necessidade da medida. Também não se deve ignorar que as Polícias devem dispor de um numero mínimo de policiais disponíveis para esta tarefa específica, bem como os Conselhos Tutelares devem disponibilizar Conselheiros nos dias e horários em que funciona a força-tarefa. Deve-se, em suma, atender às peculiaridades locais e à exigência de instalações adequadas, aspectos de cunho prático impostos pelo parágrafo primeiro do art. 149 do ECA.

CONSIDERAÇÕES FINAIS


A instituição do "toque de recolher" à primeira vista parece oriunda de um ato totalmente discricionário, revelando inclusive um suposto caráter ditatorial. Na realidade cada caso concreto deve ser analisado, sob pena de se formar uma opinião generalizada, e portanto, ingênua.

Quando a comunidade de alguma maneira alerta os órgãos do Poder Judiciário ou quaisquer outros que possam atuar em defesa dos interesses dos menores, não pode ser ignorada, sob o singelo argumento de que o ECA não prevê expressamente a imposição da limitação de horários. É desnecessário o lançamento de dados estatísticos para a realidade que grita, no cotidiano da população, o crescente envolvimento infanto-juvenil em situações de violência e submissão a hábitos nocivos e degradantes. Em respeito à imaturidade natural da condição do menor, deve-se protegê-lo, aplicando-se, contudo, parâmetros na aplicação de qualquer medida preventiva.

Desde que o menor não seja tratado como um "criminoso", esteja presente um membro de seu respectivo órgão de proteção (conselho tutelar) e haja, na localidade, aparato estatal necessário, a medida do "toque" é possível de ser aplicada. Caso seu decreto tenha seguido os trâmites procedimentais necessários, deve-s esperar se a aplicação da medida surte os efeitos desejados, podendo assim ser discutida futuramente sua manutenção ou não. A própria instituição da portaria que regulamenta a circulação noturna de menores serve de alerta à sociedade como um todo e à família de cada criança ou adolescente, em relação à necessidade de se cobrar de todos os poderes estatais o compromisso que cada um deveria honrar relacionado ao respeito aos direitos e garantias infanto-juvenis elencadas na CF/88.


CLARINDO, Aniêgela Sampaio. O toque de recolher e o direito infanto-juvenil. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2802, 4 mar. 2011. Disponível em: . Acesso em: 6 mar. 2011

quinta-feira, 3 de março de 2011

Alienação parental e seu amparo legal

Alienação Parental


Alienação parental e seu amparo legal

Embora ainda pouco conhecida, a Lei nº 12.318 que entrou em vigor em 26/08/2010 prevê punições àqueles que cometerem atos de alienação parental. A lei exemplifica alguns casos que configuram a alienação parental:

realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade;

dificultar o exercício da autoridade parental;

dificultar contato da criança ou adolescente com o genitor;

dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;

omitir deliberadamente ao genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;

apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;

mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.

A lei é recente, mas a alienação parental sempre existiu e é mais comum do que muita gente imagina. Pesquisas apontam que 80% dos filhos de pais separados sofrem algum tipo de alienação parental, que é uma forma de abuso emocional, que pode causar distúrbios psicológicos capazes de afetar a criança ou adolescente pelo resto da vida, como depressão crônica, transtornos de identidade, sentimento incontrolável de culpa, comportamento hostil, dupla personalidade, desespero, ansiedade e pânico, entre outras que, em alguns casos, são irreversíveis.

A lei 12.318/2010 criou mecanismos para combater o problema desde o início, o que antes não existia e o juiz não tinha o que fazer. Agora, o alienador pode ser multado, submetido a acompanhamento psicológico e até vir a perder a guarda caso insista no comportamento.

Vale ressaltar que, mesmo nos casos já em andamento e que não são mencionados que ocorre alienação parental, é permitido ao juiz aplicar sanções caso perceba hostilidade entre os pais separados que prejudique a criança.

Uma das maiores dificuldades é produzir provas contra o alienador. Todavia a nova lei garante que, havendo indícios da prática de alienação parental, o juiz determinará, após ouvir o Ministério Público, a realização de perícia psicológica nomeando uma psicóloga para que entreviste a criança ou adolescente e os pais, separadamente, e elabore um laudo para avaliar se existe ou não um caso de alienação parental.

Caracterizada sua prática, o juiz poderá advertir e multar o responsável, ampliar o regime de visitas em favor do genitor prejudicado, determinar intervenção psicológica monitorada, determinar a mudança para guarda compartilhada ou sua inversão, e até mesmo suspender ou decretar a perda do poder familiar.

Oficialmente reconhecida, a Síndrome de Alienação Parental adquire status de doença específica, ganhando espaço junto à psicologia, ao meio médico e, principalmente, jurídico.

Como se vê, a lei nº 12.318/2010 é um grande avanço jurídico social, isto porque, ao conceituar os atos de alienação parental, exemplificar situações que nele se enquadram e as medidas de combate e punições, referida lei contribui para que o Poder Judiciário julgue, previna e puna, com maior efetividade, casos dessa natureza. Ressalte-se que a alienação parental não é um problema somente dos genitores separados, mas um problema social, que, silenciosamente, traz consequências nefastas para as gerações futuras.



Por Valéria Fonseca de Andrade Miracca, advogada cível da Brasil Borges Direito Empresarial.

http://brasilborges.com.br/BrasilBorges/Web/Informativo/Default.aspx?ID=I11022215553977

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Plano nacional vai exigir mais proteção para primeira infância

Luiz Beltramin


Determinante para moldar personalidade, valores e o próprio desenvolvimento físico, psíquico e intelectual do adulto no futuro, a chamada “primeira infância”, período compreendido desde o nascimento até os 6 anos de idade, poderá ganhar um conjunto específico de normas.

A medida, denominada Plano Nacional pela Primeira Infância (PNPI), foi analisada pelo Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), colegiado com vínculo à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.

Apresentada oficialmente em dezembro passado, a iniciativa foi redigida pela Rede Nacional Primeira Infância, entidade composta por um conjunto de organizações da sociedade civil, governo e setor privado e, conforme os idealizadores, agora é formatada como projeto de lei, a ser enviado para o Congresso Nacional.

A proposta, explica Vidal Didonet, secretário executivo da Rede Nacional Primeira Infância, não é estabelecer um regimento conflitante com as normas que preservam os direitos de crianças e jovens já existentes, como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) ou a própria Constituição Federal, mas sim ser uma ferramenta que garanta e otimize a praticidade das normas já em vigor.

“Temos uma legislação muito avançada no Brasil com relação aos direitos da criança e adolescente, assim como a prática, muito amadurecida na formulação das políticas públicas”, reconhece Didonet. “No entanto, existe a necessidade de articulação dos planos, trabalhados muito verticalmente, sem diálogo entre as áreas”, pondera.

O plano, de 116 páginas, propõe uma visão holística sobre a infância em variados quesitos, como segurança, alimentação, saúde, educação, cultura, família, assistência social, entre outros, especificamente sobre os seis primeiros anos de vida da criança. A fase é considerada decisiva para toda a vida, segundo especialistas.

Um dos diferenciais do texto, acrescenta Didonet, é a proposta do estabelecimento de uma política setorial de longo prazo, com metas a serem cumpridas até 2022, até mesmo como forma de garantir continuidade às ações geralmente interrompidas a cada ciclo governamental, observa o secretário da Rede Nacional.

Apesar do caráter articulador, o projeto também visa preencher algumas lacunas existentes em outros planos e até mesmo em legislação vigente. “Queremos complementar as áreas carentes de um atendimento maior. Existe um plano na área de proteção à criança contra a violência, mas que precisa de atenção maior, assim como elas estão descobertas quanto aos meios de comunicação, sendo cada vez mais incentivadas ao consumo. Não temos, por exemplo, regulamentações sobre propagandas dirigidas às crianças”, observa o estudioso, radicado em Brasília (DF), e que concedeu a entrevista por telefone ao JC.


Atribuição


União, Estados e municípios estão incumbidos no cumprimento de normas já existentes e na aplicação de projetos que supram a lacuna deixada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, informa o secretário da Rede Nacional pela Primeira Infância.

Contudo, ressalva, as cidades ainda estão em fase embrionária de mobilização, sendo que apenas a Capital paulista, por meio de representantes engajados no plano, começa a viabilizar encontros para discutir formas de intervenção municipal no Plano Nacional pela Primeira Infância (PNPI), que será enviado para apreciação tanto na Câmara dos Deputados quanto no Senado Federal.

Independentemente às instituições, a proposta é fazer com que cada profissional saia do meio acadêmico apto a lidar com a primeira infância. “Os profissionais, exceto o médico pediatra, deixam a faculdade sem nenhum estudo específico sobre criança”, opina.


Direito de brincar


Um dos destaques do Plano Nacional pela Primeira Infância (PNPI) é assegurar que todas as crianças, ainda mais na faixa etária de zero a 6 anos, possam ter acesso ao lúdico, ou seja, brincar e assim garantir pleno desenvolvimento.

“O ato de brincar está cada vez mais ausente. Nas escolas, com árvores cortadas e parques pavimentados, ou pela escassez de tempo, hoje a criança é submetida a outras atividades substitutas, o que é um engano. Em casa também se brinca menos. Na pobreza, a criança não tem brinquedo, mas há problema de espaço tanto nas classes menos favorecidas quanto na classe média, porque as casas estão cada vez mais apertadas. E nas classes mais altas, as crianças estão sobrecarregadas de conteúdo e não conseguem brincar”, acentua Vidal Didonet, secretário executivo da Rede Nacional Primeira Infância.

E a falta de brincadeira nessa fase da vida pode trazer sérios prejuízos na vida adulta, atesta a psicóloga educacional bauruense Vera Okubo. “O lúdico faz parte dessa etapa da infância de zero a 6 anos. Através do brincar ela elabora vários conteúdos e soluções de conflitos. Se essa fase é pulada, certamente faltará em algum lugar lá na frente”, relaciona. “A criança não pode deixar de ser criança. Não pode ter agenda de adulto”, completa a psicóloga.


Delitos estão relacionados com falta de cuidados


Diversas formas de amparo também são levantadas pelo Plano Nacional pela Primeira Infância (PNPI), que dedica páginas tanto às atribuições familiares quanto às institucionais. A falta de cuidado na primeira infância, principalmente em casa, asseguram autoridades do setor, influencia diretamente na prática de delitos e provoca, consequentemente, encaminhamento para entidades socioeducativas anos mais tarde.

Para a titular da Delegacia da Infância e Juventude (Diju) de Bauru, Rejani Borro Ortiz Tiritan, a medida é válida, principalmente, como ferramenta para cumprimento prático da lei. “Temos que ter esperança. Se foi elaborado o plano, é porque existe vontade política de que a lei seja aplicada”, confia a delegada de polícia.

Mesmo havendo o ECA, conjunto de normas que já garante os direitos da criança, a presidente do Conselho Tutelar de Bauru, Roberta Maria Almeida de Oliveira, reconhece a necessidade de um olhar diferenciado para a chamada primeira infância.

“Sem dúvida, a primeira infância é a época de formação da criança, a idade da alfabetização, por isso merece uma atenção diferenciada. O desenvolvimento da criança, em todos os sentidos, depende dessa primeira fase”, enfatiza a presidente Roberta.

Tanto é que, de janeiro a dezembro do ano passado, o órgão contabilizou 1.459 atendimentos que envolveram, de alguma forma, crianças na faixa etária focada pelo Plano Nacional.

Já o presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA), em Bauru, padre João Inácio Rodrigues, foca outro importante agente curador do bem-estar infantil nessa idade, os pais.
“Os governos em todas as esferas têm de propiciar condições dignas para as crianças nos mais variados aspectos da formação humana. Nessa fase, a criança precisa de um conjunto de leis que as defenda”, aprova. “Contudo, o ideal é que chamemos a atenção para a primeira responsabilidade, que é dos pais”, sentencia.

Independentemente à atribuição de responsabilidades ou quantidade de normas existentes e que ainda carecem de crivos legislativos ou governamentais, a psicóloga educacional Vera Okubo chama atenção para um detalhe que pode ser todo o diferencial entre leis, estatutos ou recomendações timbradas: “Mas e a prática, será que ela acontece?”, questiona.


Fontre: CJ Net http://www.jcnet.com.br/detalhe_geral.php?codigo=201850

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Vitória contra a Alienação Parental em Bragança Paulista

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO


Ementa

Apelação / Regulamentação de Visitas

Comarca: Bragança Paulista

Órgão julgador: 4ª Câmara de Direito Privado

Data do julgamento: 11/11/2010

Data de registro: 29/11/2010

Outros números:.........................

Ementa: Voto n.° 14.804 Regulamentação de visitas. Genitor apto ao exercício de direito. Criança com mais de oito anos. Pernoite está em condições de prevalecer. Oportunidade para que pai e filho, em ambiente descontraído, possam ampliar a afetividade. Prevalência do interesse do menor. Obstáculo apresentado pela genitora é prejudicial a criança. Individualismo da mãe deve ser afastado de plano. Procedimento da apelante caracteriza alienação parental. Recorrente já propusera ação de destituição de pátrio poder em face do recorrido, porém, sem sucesso. Beligerância entre as partes não pode afetar o relacionamento com o filho. Apelo desprovido.


A C Ó R D ÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n° 990.10.217441-7, da Comarca de Bragança Paulista.
(ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA) sendo apelado LÚCIO BESSA CECAN (ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA). ACORDAM, em 4 a

Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte d e c i s ã o: "NEGARAM PROVIMENTO AO R E C U R S O. V. U . ", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Desembargadores TEIXEIRA LEITE (Presidente) e FRANCISCO LOUREIRO.

São Paulo,11 de novembro de 2010.

Voto n.° 14.804

Regulamentação de visitas. Genitor apto ao exercício de direito. Criança com mais de oito anos. Pernoite está em condições de prevalecer. Oportunidade para que pai e filho, em ambiente descontraído, possam ampliar a afetividade. Prevalência do interesse do menor. Obstáculo apresentado pela genitor a é prejudicial a criança. Individualismo da mãe deve ser afastado de plano. Procedimento da apelante caracteriza alienação parental Recorrente já propusera ação de destituição de pátrio poder em face do recorrido, porém, sem sucesso. Beligerância entre as partes não pode afetar o relacionamento com o filho. Apelo desprovido.

1. Apelação interposta tempestivamente, com base na r. sentença de fls. 1.185/1.193, cujo relatório se adota, que julgou procedente ação de regulamentação de visitas. Alega a apelante que a sentença merece reforma, pois fora demonstrada a inviabilidade de pernoites nas visitas, já que/ô apelado não participa da vida da criança, a qual tem pleno discernimento das coisas. A seguir destacou que o recorrido não faz esforço para conquistar o amor do filho, não havendo, assim, laços afetivos e de convivência. Continuando declarou que o direito de visitas não é absoluto e poderá causar trauma à criança, sendo que o pernoite somente trará prejuízos. Por último requereu a improcedência da ação; alternativamente, que as visitas fixadas não abranjam pernoite.

O recurso foi contra-arrazoado, rebatendo integralmente a pretensão da apelante, fls. 1.213/1.232. A d. Procuradoria Geral de Justiça apresentou parecer, opinando pelo desprovimento do recurso, destacando, ainda, o mau comportamento da apelante e de sua família, sendo o caso clássico de Síndrome de Alienação Parental, fls. 1.306/1.308.

É o relatório

2. A r. sentença apelada merece ser mantida.

Os estudos psicológico e social demonstraram que a criança está apta a ampliar o vínculo afetivo com o genitor, salientando, ainda, que quando não se encontra na presença da mãe o filho aceita o pai com tranqüilidade, fls. 1.251.

Por outro lado, a beligerância entre os pais é enorme, a ponto, inclusive, de a apelante ter proposto ação de destituição de pátrio poder em face do apelado, porém, sem êxito, de acordo com o v. acórdão de fls. 1.283/1.291.

A criança está em condições de pernoitar com o genitor, bem como permanecer na companhia do pai por ocasião das férias escolares e demais datas, como constou da sentença.

A apelante resiste à pretensão do apelado de forma aleatória, pois nada se comprovou de que o contato da criança com o genitor fosse prejudicial, mas, ao contrário, por ocasião da realização do estudo social o menor se encontrava bem adaptado ao lar paterno, possuindo ótima convivência com o pai e com os avós, fls. 224/225

Desta forma, a performance da apelante é com o aspecto teleológico de obstar o contato do filho com o pai, o que não pode sobressair, haja vista que o individualismo da mãe é prejudicial para a criança, mesmo porque, devem ser criadas oportunidades para a visitação, inclusive ampliando-a com o decorrer do tempo, sempre no interesse do menor.

"Cumpre aos pais não se esquecer que se eles estão se separando ou divorciando um do outro não podem deixar que ocorra a separação no tocante aos filhos, para que possam estes, no futuro, enfrentar com menos dificuldade a nova e difícil realidade com que terão que convier, advertindo Luiz Edson Fachin e Carlos Eduardo Pianovski Ruzyk: 'Respondem os cônjuges que rompem a vida em comum ao desafio de não se
separarem nem se divorciarem de seus próprios filhos, muito menos de não transformá-los no objeto litigioso do amor findo. A finitude do relacionamento do casal não deve seccionar a infinitude permanente da vida entre pais e filhos. "

(Antônio Carlos Mathias Coltro, Sálvio de Figueiredo Teixeira, Tereza Cristina Monteiro Mafra. Comentários ao Novo Código Civil.

Direito Pessoal. Arts. 1.511 a 1.590. Volume XVII. pág. 442)

A jurisprudência assim entende:

"No campo das visitas, o guardião do menor é devedor de uma obrigação de fazer, ou seja, tem/f dever de facilitar a convivência do filho com o visitante nos dias previamente estipulados,devendo se abster de criar obstáculos para o cumprimento do que fora determinado em sentença ou fixado no acordo." (REsp 701.872/DF. Recurso Especial 2004/0.161.226-7. Ministro Fernando Gonçalves. Quarta Turma. J. 12-12-2005)

A situação fática exige oportunidade para que o relacionamento seja espontâneo, a fim de que a afetividade se desenvolva de forma aconchegante, destacando-se, ainda, a intimidade que deve existir entre pai e filho, por conseguinte, o pernoite, na faixa etária em que se encontra o menor, é benéfico, possibilitando que a própria criança tenha convivência com a família paterna, sem influência da genitora, ao menos no período em que permanece em visitação com o genitor que permanece em visitação com o genitor.

"A visitação não é somente um direito assegurado ao pai ou à mãe - é um direito do próprio filho de com eles conviver, o que reforça os vínculos paterno e materno-filial. Talvez o certo fosse falar em direito a visita. Ou, quem sabe, melhor seria o uso da expressão direito de convivência, pois é isso que deve ser preservado mesmo quando pai e filho não vivem sob o mesmo teto. Olvidou-se o legislador de atender às necessidades psíquicas do filho de pais separados. Consagrando o princípio da proteção integral, em vez de regulamentar as visitas, é necessário estabelecer formas de convivência, pois não há proteção possível com a exclusão do outro genitor. O direito a visitas é um direito de personalidade, na categoria do direito à liberdade, pelo qual o indivíduo, no seu exercício, recebe as pessoas com quem quem quer conviver. Funda-se em elementares princípios de direito natural, na necessidade de cultivar o afeto, de firmar os vínculos familiares à
subsistência real, efetiva e eficaz. É direito da criança de manter contato com o genitor com o qual não convive cotidianamente, havendo o dever do pai de concretizar esse direito. E totalmente irrelevante a causa da ruptura da sociedade conjugai para a fixação das visitas. O interesse a ser resguardado, prioritariamente, è o do filho, e objetiva atenuar a perda da convivência diuturna na relação parental." (Maria Berenice Dias. Manual de Direito das Famílias. Editora Revista dos Tribunais. 4a edição. 2008. Pág. 398)

Por último, a atuação irregular da apelante é notória e dificulta o contato da criança com o pai, afrontando, assim, o artigo 2o, parágrafo único, inciso III, da Lei n.° 12.318, de 26 de agosto de 2010, caracterizando, então, notório procedimento de alienação parental, o que dá respaldo para a modificação da guarda do menor, além das conseqüências pertinentes.

3. Com base em tais fundamentos, nega-se provimento ao apelo.
Fonte: Pais pos Justiça via Facebook: http://www.facebook.com/profile.php?id=100000152478126#!/home.php?sk=group_118301541564972

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Disque Direitos Humanos para Idosos, LGBT e Moradores de Rua

Governo amplia atendimento do Disque 100 para idosos, LGBT e moradores de rua


Gilberto Costa

Repórter da Agência Brasil



Brasília – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva anuncia em instantes em São Paulo a ampliação do serviço Disque 100. Lula participa na capital paulista da cerimônia de celebração do Natal dos catadores e da população em situação de rua.



Com a ampliação, o serviço, que desde 2004 presta informações, recebe e encaminha denúncias de violações de direitos de crianças e adolescentes, passa a atender moradores de rua; lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros (LGBT); e idosos. Em fevereiro, o serviço incluirá o atendimento a pessoas com deficiência.



A ampliação do Disque 100, agora Disque Direitos Humanos, envolveu a contratação da empresa Call Tecnologia, de Brasília, que venceu licitação pública (pregão eletrônico) e receberá cerca de R$ 14 milhões em um ano. O contrato poderá ser renovado, conforme avaliação da Secretaria de Direitos Humanos (SDH), ligada à Presidência da República.



Segundo o coordenador-geral do Disque Direitos Humanos, Pedro Costa Ferreira, a estrutura do serviço foi ampliada em 6 de dezembro, ainda em caráter de teste. A partir de fevereiro, o serviço poderá atender até 100 ligações simultaneamente.



A expansão do serviço era uma demanda dos novos segmentos atendidos, que fizeram esse pedido durante as conferências temáticas realizadas no governo Lula, e poderá suprir a falta de canais de informação e denúncia no país.



De acordo com pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), dos 5.565 municípios brasileiros, apenas 1.450 têm estrutura para receber denúncias de violações de direitos humanos (26,6%).



O Disque Direitos Humanos (Disque 100) é gratuito e atende 24 horas.





Edição: Lílian Beraldo
Fonte: http://agenciabrasil.ebc.com.br/web/ebc-agencia-brasil/enviorss/-/journal_content/56/19523/1126665

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Projeto de Lei 05515/2009 que altera os arts. 1.583 à 1.586 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, Agora é Lei!

Já está em vigor a lei (13.058/14) que determina a guarda compartilhada como regra no caso da separação dos pais.

“Art. 1.584. ............................................


§ 2º Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, será

aplicada, sempre que ambos os genitores estejam aptos a exercer o poder familiar, a guarda

compartilhada.

......................................................”(NR)

Art. 3º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Justificação:

Tendo surgido na Inglaterra, pelos idos de 1960, a guarda compartilhada, praticamente, está presente

em grande parte das legislações de países ditos democráticos.

Antes do surgimento do instituto, ou da evolução dos costumes, a guarda da criança era invariavelmente

deferida à mãe.

Hoje, não resta dúvida, a guarda de filho menor deve ser repartida entre ambos os genitores, atendendo-se

fundamentalmente o interesse da criança.

Já não se há mais de falar em direito de visita, pois ambos os pais têm os mesmos direitos e deveres com

relação ao filho menor, o que, indubitavelmente, fará com que a criança cresça com respeito e consideração

para com aqueles.

Silvio Rodrigues, emérito civilista, ao analisar o pátrio poder, sob a ótica do direito civil, diz que este é:

“o conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais em relação a pessoa e aos bens dos filhos não

emancipados, tendo em vista a proteção destes”.

Nossa Constituição Federal, em seu art. 227, estabelece como dever da família, da sociedade e do

Estado, assegurar com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer,

à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,

além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e

opressão.

A partir do momento em que a sociedade conjugal se dissolve, os genitores não podem ficar alijados

do desenvolvimento de sua prole, isto é certo. Mas, levando-se em consideração o melhor interesse

da criança, quando a guarda dos filhos menores não puder ser deferida por inaptidão de qualquer dos

genitores, dever-se-á, mesmo assim, impor a guarda compartilhada para ambos?

Cremos, assim, que o atual art. 1584 do Código Civil, que inseriu a guarda compartilhada em nosso

ordenamento, deve ser modificado para adequar-se aos ditames constitucionais e ao próprio instituto da guarda compartilhada.

Mesmo com a lei em vigor, caberá ao juiz decidir caso a caso se é possível a guarda compartilhada. A guarda unilateral será concedida apenas quando um dos pais abrir mão do direito ou caso o magistrado verifique que o filho não deva permanecer sob a tutela de um dos responsáveis. Neste caso, quem abrir mão da guarda fica obrigado a supervisionar os interesses da criança. O juiz deverá ainda estabelecer qual será o local de moradia dos filhos, que deve ser a que melhor atender aos interesses da criança.

Fonte: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2014/lei-13058-22-dezembro-2014-779828-publicacaooriginal-145706-pl.html

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Mãe foge para evitar que o pai tenha contato com os filhos.

Uma prática costumeira, vivenciada em nossa sociedade, cujas vítimas diretas são as crianças.

Resolvi escrever esse artigo, bastante informal, para esclarecer alguns tópicos.

As separações nem sempre são litigiosas, mas, mesmo as consensuais, quase sempre terminam em litígios. Isso quando há filhos menores envolvidos.

Um choque, para quem recebe o pedido de separação, que pode levar até dois anos para processar.

Quando a separação é litigiosa, costuma-se definir tudo judicialmente. Guarda, visitação, pensão, bens, etc.

Quando é consensual, ou quando não havia uma relação de casamento, onde não há a necessidade de recorrer à justiça, na maioria das vezes, o homem sai do lar. Por desconhecimento, desinteresse ou uma questão cultural, ninguém fala sobre os filhos...Há um pequeno acerto sobre uma ajuda aos filhos e não é decidido nada sobre visitas.

Há um tratamento cordial...

Teoricamente, tudo certo. O pai vai depositando..., nem sempre os mesmos valores; vê os filhos de vez em quando e a vida segue.

Eis que um dos dois conhece alguém, com quem pretende manter um relacionamento duradouro...

Opa! Nesse momento, desperta algo no outro.

Bom, aqui a saga inicia...

Teoricamente, quem sai do lar é justamente quem pediu a separação. Pediu a separação, porque o relacionamento já não vinha sendo lá essas coisas. Então, uma parte vai processando e antevendo a separação como uma saída daquela situação. A outra parte também sente que as coisas não vão bem, mas nem passa pela mente a possibilidade da separação e, também, não faz nada para mudar, além de reclamar para os mais próximos, como parentes e amigos.

E agora?...Até então, ninguém pensou nas crianças, ninguém definiu nada a respeito de guarda, pensão, visitas... Nada!. E uma das partes está iniciando uma nova vida, com outra pessoa que pode prejudicar meu filho, que pode ser perigosa...

O importante, em todos os casos, é que as crianças mantenham um relacionamento saudável com ambas as partes do casal após o divórcio, o que nem sempre é possível.

A separação deve ser comunicada aos filhos de forma natural, sem dramas e acima de tudo sem julgamentos de valor acerca de qualquer um dos parceiros, a menos que as próprias crianças tenham deparado com situações de violência física ou moral por parte de um dos pais. O diálogo deve sempre ser positivo, centrando-se no futuro e usando a verdade. Acima de tudo é necessário fazer perceber à criança ou ao jovem que não lhe cabem quaisquer culpas na separação e excluí-los sempre das questões pessoais. Nesta fase as crianças e os pais vão estar mais vulneráveis, por isso a paciência e o respeito mútuo são conceitos que os pais não podem perder de vista.

É, mas nada disso aconteceu.

É preciso também ter em atenção às reações das crianças face a esta nova situação, à qual reagem de formas diferentes que podem ir da tristeza à culpabilidade, medos infundados ou não, regressões na idade, agressividade, dificuldades de atenção (dispersão) ou sintomas ainda mais graves de doença.

Retomando...

Onde paramos? Ah, sim...no início.

Diante desse quadro desesperador, sem qualquer norte, a mãe foge com a criança, para outro Estado. Se fosse outro País, tudo bem, seria mais fácil trazer de volta. Mas, como é outro Estado, a coisa complica um pouco.

Em dado momento a mãe sumiu. Não deu endereço a ninguém. Ou deu, foi morar na casa dos pais, bem longe de onde mora. O pai da criança entra em desespero. O que fazer?

Quer a guarda, mas pretende não interromper a convivência. Quer que se estabeleça o direito de visita. Aqui começam as dúvidas. A ação cabível é de regulamentação de visitas ou de guarda? A valoração emocional nos impulsiona a garantir primeiro a visita para depois questionar a guarda. Mas, segundo a Lei (8.069/90) ECA, para se estabelecer a visita, a guarda tem de estar homologada judicialmente. Esta pode demorar uma eternidade e prejudicar a primeira. Entende-se que não se podem acomodar guarda e visita numa só ação. Muito menos a ação de alimentos. Qual solução?

Pelos fatos pode-se propor uma ação cautelar de direito de visitas, que é mais rápida. Ou propor ação ordinária de guarda com cautelar de visitas. Assim, enquanto a ação de guarda tramita, não é interrompido o contato. Isso impede, muitas vezes, o alienador agir de forma concreta, ou, pelo menos inibe.

Quando for o caso, em face de provas concretas, pedir liminar de guarda provisória até o final da ação. Vai depender de estudo social, psicológico, favoráveis ao pai, provas robustas de interesse da criança...

Mas não é, no nosso caso. Aqui, pai e mãe são aptos a criar e cuidar dos filhos, sem qualquer impedimento.

Viajar? Pode sim. Infelizmente pode. A mãe, por enquanto, não cometeu crime algum, mesmo havendo já uma sentença estipulando visitação aberta para o pai.

Então por quê pedir a guarda para si? Por quê querer a guarda só para si? Seria uma forma de vingança? Mas vingança contra quem? Quando queremos nos vingar, não seria para castigar quem nos fez mal? Nesse caso estaríamos castigando nossos filhos.

E a criança, que está sofrendo sem poder expressar ou se defender, como fica?

Voltando...

A melhor solução a ser tomada seria um pedido de busca e apreensão da criança? Em alguns casos sim, mas e os traumas nas crianças? Já pensaram? Não vale a pena, salvo onde há violências, como dito antes.

Então, só resta um entendimento com a mãe ou a justiça. Um bom advogado, com afinidades na Guarda Compartilhada e familiarizado com a SAP.

Quem ganha uma causa, não é o mais justo e sim o advogado! Sem ofensas, essa é a minha opinião.

Uma dica: Quanto mais BO”s, maior é o litígio; quanto maior o litígio, mais demorada a sentença.

Lembre-se: O que está em julgamento é uma situação e não pessoas.

A Lei de Guarda Compartilhada está aí e deve ser cumprida.


Este post não permite mais comentários!
Paulo R. Consul

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Coordenadoria da Infância e Juventude divulga enunciados e recomendações

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) divulga enunciados e recomendações relativos a crianças e adolescentes usuários de drogas. O parecer decorreu do seminário Ações de articulação e mapeamento de serviços para a proposição de diretrizes de atuação, realizado em 2010.

A Coordenadoria da Infância e da Juventude tem mapeado a demanda não apenas pelas consultas feitas pelos magistrados, mas também pelos temas discutidos nas diversas visitas realizadas ao interior do Estado.

As diretrizes apontam a necessidade de aprofundamento dos seguintes temas: a caracterização jurídica da criança e adolescente em sua relação com a droga e a forma como é atendida pela Justiça; a diferença das modalidades de intervenção diante das variações de frequência do uso; a compreensão das finalidades específicas das medidas de proteção e as socioeducativas; a observância dos direitos individuais e civis do usuário de droga e o respeito ao devido processo legal na determinação de internação para tratamento; a necessidade de difusão do marco legal e das diretrizes das políticas de atendimento a usuários de drogas para uma mais efetiva tutela de direitos coletivos e difusos; a possibilidade de sua cobrança judicial e os modos de intervenção da Justiça.

Como estes campos de aprofundamento em mente, foram formulados os enunciados e recomendações, cuja divulgação é recomendada a todos os magistrados e equipes interprofissionais do Judiciário.

Para o coordenador da Infância e Juventude do TJSP, desembargador Antônio Carlos Malheiros, o parecer aponta metas, objetivos e tudo o que há de necessário para atender razoavelmente os jovens envolvidos com a questão da drogadição. ENUNCIADOS

1. As internações psiquiátricas para tratamento da drogadição, qualquer que seja a modalidade, só pode ser feita mediante laudo médico circunstanciado que caracterize e fundamente os motivos, nos termos do art. 6º da lei 10.216/2001

2. Preferencialmente a avaliação sobre a necessidade ou não de internação deve ser feita por médico da rede.

3. Medidas socioeducativas privativas de liberdade não devem ser utilizadas para garantir tratamento da drogadição.

4. A falta de adesão a tratamento da drogadição não deve impedir a extinção de medida socioeducativa em meio aberto se os demais compromissos tiverem sido cumpridos.

5. A internação compulsória não deve ser utilizada como extensão de medida socioeducativa ou equiparada a medida de segurança.

RECOMENDAÇÕES


1. Articulação regional para atendimento pela rede, mapeando-se os recursos existentes.

2. A rede, no que se incluem as Varas da Infância e da Juventude, deve oficiar aos conselhos de direito da criança e do adolescente para que sejam estabelecidas as diretrizes de atendimento aos usuários de drogas no município de forma descentralizada, estabelecendo-se as instituições responsáveis pelo atendimento inicial de modo que a complexidade do problema seja enfocada, direitos sejam garantidos, sem que haja a indevida criminalização da conduta dos usuários de drogas.

3. A rede, mas também os magistrados, deve oficiar aos promotores de justiça e aos defensores públicos que atuam em defesa de direitos de crianças e adolescentes para ajuizamento de ação civil pública visando a criação de CAPS-AD, dos demais serviços previstos na legislação específica para saúde mental e da rede de apoio necessária.

4. A rede deve subsidiar o Ministério Público e a Defensoria Pública com dados que permitam o ajuizamento das ações referidas.

5. Realização de reuniões de rede para identificação das lacunas ou curtos-circuitos do atendimento e construção de possibilidades de superação das dificuldades, devendo ser convidados os magistrados, promotores de justiça e defensores públicos.

6. Havendo necessidade de internação, deve ser feita em ala psiquiátrica específica para crianças e adolescentes, velando pela questão de gênero.

7. Necessidade de formação interdisciplinar sobre direitos da criança e do adolescente e os direitos dos usuários de serviço de saúde mental.

8. Estabelecimento de diretrizes para os ambientes de atendimento de crianças e adolescentes usuários de drogas, observando as especificidades culturais e fases de desenvolvimento.

9. Estabelecimento de diretrizes para o acolhimento e atendimento de crianças e adolescentes de forma a respeitar suas especificidades, conforme sua etapa de desenvolvimento; contemplando capacitação para os profissionais.

10. Criação de um Fórum Estadual de Saúde Mental que contemple os diversos setores do Sistema de Garantia de Direitos de Crianças e Adolescentes.

11. Definição por parte do Fórum Estadual de fluxo de atendimento, estabelecendo-se as instituições responsáveis pelo atendimento inicial de modo que a complexidade do problema seja enfocado, direitos sejam garantidos, sem que haja a indevida criminalização da conduta dos usuários de drogas.



Assessoria de Imprensa TJSP - AG
http://www.jurisway.org.br/v2/noticia.asp?idnoticia=64693

domingo, 23 de janeiro de 2011

Caso Bruna: pai luta para reaver a filha nos EUA


Bruna, durante brincadeiras na casa do pai, ao lado de uma das bonecas favoritas (Foto: Álbum de Família)

Alessandra Vieira e Elô Baêta – Repórteres

Foi através de um amigo que Eduardo conheceu Michelly. Logo, troca de olhares e pequenas gentilezas comuns aos enamorados passaram de esporádicos a constantes encontros. Namoro selado, mas longe de chegar perto daquelas duradouras histórias de amor que terminam aos pés do altar ou diante do juiz. Teve um fim. “Ela tinha voz mansa, aparentava ser tranquila, mas só aparentava… Era, na verdade, muito ciumenta e agressiva… Brigávamos muito… Por isso resolvi terminar…”. Depois de algum tempo, a recaída em um encontro casual resultou na surpresa: Michelly estava grávida. A notícia soou como um presente para Eduardo e sua família. Era a oportunidade de tornar os seus pais avós.

Sete de setembro do ano de 1997. Bruna Maria nasce na Maternidade Frei Fabiano, em Maceió. A pequena crescia em constante convívio com o pai, embora Eduardo e Michelly não fossem casados. Sete anos depois, uma sequência de fatos desencadeados pela mãe de Bruna iria separar Eduardo da filha…
Em 2004, a alagoana Michelly de Paula, 32, daria início a um drama pouco comum em Alagoas. Após assumir namoro com o norte-americano Rodney Richards e o desejo de se casar e morar nos Estados Unidos, comunica a intenção de levar a pequena Bruna Maria Vasconcelos com ela. A ideia não agradou ao pai Eduardo Vasconcelos, 36. “Naturalmente fui contra. Não queria que minha filha ficasse na dependência moral e financeira de uma pessoa que a própria mãe mal conhecia. Eu nunca o vi pessoalmente, mas não tenho boas referências dele. Certo dia, minha filha disse que, em um quarto de motel, durante uma viagem que fez com a mãe e o americano, presenciou a Michelly apenas de calcinha, se ‘abraçando’ com Rodney, que estava apenas de cueca. Entrei em contato com ela, pedindo que evitasse essa situação diante da filha, ela negou, disse que era fruto da imaginação de Bruna”.
Mas Michelly insistia na ideia da viagem, alegando ser uma oportunidade de “mudar de vida”, já que no Brasil vivia apenas da pensão que Eduardo pagava “religiosamente em dia” para cobrir todas as despesas da filha. “Sugeri que ela fosse, mas que Bruna ficasse comigo e depois de um ano voltaríamos a conversar sobre o assunto para decidirmos o que fosse melhor para a nossa filha. Ela fingiu concordar…”, disse Eduardo com exclusividade ao O JORNAL.

Tempos depois, Michelly procurou Eduardo solicitando que assinasse o passaporte de Bruna. Era o primeiro ato de uma trama ousada. “Inicialmente, também não concordei. Ela disse que isso não estaria autorizando a viagem de Bruna e que, como ela tinha solicitado o passaporte das duas, caso eu não assinasse, o processo dela teria que ser recomeçado, e isso iria prejudicá-la. Como eu pretendia fazer uma viagem para a Disney com minha filha, resolvi ir à Polícia Federal me certificar do que eu estaria assinando. Fui informado por um agente que realmente não estaria autorizando a viagem, isso seria apenas a emissão de um documento de identidade internacional e que, para viajar, a criança necessitaria de uma autorização minha. Com o objetivo de não prejudicar os interesses da mãe em se casar com o americano, assinei a emissão do Passaporte. Não imaginei que, neste momento, estaria facilitando uma ação criminosa que Michelly planejava”.
Ousadia e astúcia
Foi no Recife que a mãe de Bruna seguiu com o seu plano. Entrou com um pedido de autorização de viagem no Juizado da Infância e da Adolescência informando que residia na capital pernambucana, segundo Eduardo, apresentando um comprovante de residência de uma amiga de sua mãe e alegando que ele se encontrava em local “incerto e não sabido”. “Declarou ainda que eu era um pai ausente e que não pagava pensão há mais de dois anos. Por isso, o juiz autorizou a viagem após ter me intimado por edital, do qual não tomei conhecimento porque sempre vivi em Alagoas ”.

Uma jogada de mestre. Era tudo o que Michelly precisava para dar continuidade ao seu plano. A ida a Pernambuco era a garantia de que Eduardo não teria como provar seu constante convívio com a filha e, portanto, não estaria em “local incerto e não sabido”, fator determinante para a publicação do edital, o qual desconhecia por sua circulação ser apenas a nível estadual.


Em maio de 2005, um telefonema de Michelly concretizou o drama: Bruna tinha sido levada para os Estados Unidos sem o conhecimento de Eduardo. “Eu e meus pais ficamos desesperados. Não sabíamos o que fazer nem a quem recorrer. Meu pai deu queixa nas polícias Civil e Federal. A Civil fez muito pouco, apenas confirmou que a mãe e minha filha não se encontravam no endereço de residência e que os familiares não sabiam informar onde elas estavam. A Polícia Federal foi mais ativa e rapidamente descobriu que a mãe e a menor embarcaram em um voo da American Air Lines para Denton, no Texas. Descobriram também toda a trama feita por Michelly para conseguir a autorização de viagem de forma fraudulenta, aparentemente enganando a Justiça pernambucana. Não posso acreditar que o juiz tenha tido participação nesse crime”.

Daniel Fantini, delegado da Polícia Federal de Minas Gerais – à época atuando em Alagoas -, prosseguiu as investigações. De acordo com as declarações de Eduardo, indiciou Michelly em um processo criminal que está em fase conclusiva na Justiça Federal e pediu a prisão preventiva da mãe da menina, mas teve seu pedido negado. “Identificamos que a mãe de Bruna se valeu de uma autorização da Justiça pernambucana com informações falsas, afirmando que residia em Pernambuco e que a criança não via o pai há dois anos, mas Bruna sempre viveu e estudou em Maceió. Entramos em contato com a Interpol (Polícia Internacional) para saber onde a menina estava residindo nos Estados Unidos e solicitamos a prisão preventiva de Michelly. A Justiça pernambucana foi induzida a erros, é difícil atribuir responsabilidades. As mentiras possibilitaram a autorização”, explicou Fantini, afirmando que a vida de Bruna era constantemente acompanhada tanto pelo pai quanto pelos avós paternos. “As fotos apresentadas por ele comprovam a estreita convivência”, completa.

Fonte: http://www.ojornalweb.com/2011/01/23/caso-bruna-pai-luta-para-reaver-a-filha-nos-eua/

"Constatava-se cegueira do Estado em relação à alienação parental"

O Dr. Elizio Perez é um dos maiores estudiosos do tema da alienação parental no Brasil. Juiz do Trabalho em São Paulo, o Dr. Elizio Perez foi o responsável pela consolidação do anteprojeto que deu origem à lei sobre a alienação parental (Lei 12.318/10), sendo profundo conhecedor do assunto.  

O Sr. trabalhou na elaboração do anteprojeto que deu origem à lei 12.318/2010, a chamada Lei da Alienação Parental. Pode-se dizer que o Sr. tenha sido o idealizador da lei?




Na verdade, lancei uma primeira versão de anteprojeto a debate público, em maio de 2008, divulgando-o em sites de associações de pais e mães e de profissionais do Direito e da Psicologia. Coletei as críticas e sugestões que vieram, de todas as origens (desde profissionais experientes até pais e mães que enfrentavam, no seu cotidiano, o problema), o que deu origem a 27 (vinte e sete) versões do texto, que foi quase que totalmente reescrito. Acredito que foi esse processo que deu legitimidade para que o anteprojeto fosse adiante. Do meu ponto de vista, havia uma demanda de pais e mães que enfrentam o problema e esse debate prévio, com erros e acertos, conseguiu captá-la. A preocupação era a de criar um instrumento que ajudasse a inibir ou atenuar, de forma efetiva, a alienação parental, com consistência técnica, mas que também fosse viável, do ponto de vista político. Durante a tramitação do projeto, no Congresso, o projeto ainda sofreu modificações e, a meu ver, foi melhorado, exceção feita ao veto presidencial à mediação. Por isso, digo que o texto tem autoria coletiva e minha participação é a de ter consolidado o anteprojeto.



Ainda se percebe a prevalência da guarda unilateral à guarda compartilhada, apesar desta ter sido reconhecida por nosso ordenamento jurídico há mais de dois anos. Quanto à aplicação da lei da alienação parental, o Sr. acha que os operadores do direito estão preparados para ela?



É certo que a atribuição da guarda não é questão simples e exige, muitas vezes, exame em concreto das possíveis soluções que melhor atendam aos interesses das crianças e adolescentes. No entanto, o que se percebe é que, a pretexto de se defender esse interesse, muitas vezes adota-se a solução mais conservadora, que estaria em uma aparente zona de conforto, do ponto de vista da prática jurídica. Silenciar o conflito com a guarda unilateral nem sempre é a melhor solução para a formação da criança. Muitas vezes, o conflito tem origem justamente em controvérsias decorrentes do saudável exercício da autoridade parental, na busca do melhor interesse da criança ou adolescente. E o Judiciário não pode fechar os olhos para essas questões. Há estudos - vale lembrar o trabalho da Prof.ª Leila Torraca, do departamento de Psicologia da UERJ - que demonstram que argumentos recorrentemente utilizados para fundamentar a não-aplicação da guarda compartilhada são, muitas vezes, inconsistentes. Se é verdade que, em algumas hipóteses, é razoável questionar a viabilidade da guarda compartilhada, em um amplo leque de situações ela seria cabível. A mera existência de dissenso entre o ex-casal, por exemplo, não parece ser motivo suficiente para obstar a guarda compartilhada.



A lógica de solução do conflito pela atribuição de guarda parece ser falha, fadada ao insucesso. O conflito é inerente ao ser humano. Em outra abordagem, podemos considerar que a guarda compartilhada, como forma de regular a autoridade parental e eventuais abusos, é algo claramente favorável ao interesse da criança ou adolescente. Estabelecer guarda unilateral em decorrência exclusiva de dissenso entre o ex-casal parece ser submeter a criança, em formação, às dificuldades dos adultos, que podem lidar melhor com suas dores e conflitos. Não pretendo, com isso, propor conivência com conflitos gerados por exercício abusivo da autoridade parental, mas dizer que, regra geral, o estabelecimento da guarda unilateral não parecer ser o melhor encaminhamento para o problema.



O art. 7ª da Lei da Alienação Parental estabelece um critério adicional para lidar com essa questão: se há insistência para que a guarda seja unilateral, então, para exercer a guarda, o juiz deve priorizar o genitor que viabiliza a efetiva convivência da criança ou adolescente com o outro genitor. Não se trata, evidentemente, de propor convivência formal, mas de viabilizá-la, de fato, o que, muitas vezes não é tão difícil de se constatar. Não basta propor regime de convivência cuja implementação, na prática, é inviável. Acredito que esse critério, bem aplicado, induz a aplicação mais ampla da própria guarda compartilhada; a melhor forma de viabilizar a convivência e participação ampla do outro genitor na vida da criança é convidá-lo ao exercício compartilhado da guarda. Na pior hipótese, esse critério pode servir para que se obtenha, já no início do processo, ao menos, duas propostas consistentes que garantam a efetiva participação de pai e mãe na formação de seus filhos.



Sobre a aplicação efetiva da Lei da Alienação Parental, acho que deve haver um período de maturação. No entanto, alguns dispositivos da lei decorrem da própria resistência dos operadores do Direito em dar resposta efetiva às questões relacionadas à alienação parental, estão relacionados ao momento social que vivemos. Por isso, considero que a lei não deve ser examinada apenas sob o aspecto técnico-jurídico, mas também no aspecto em que enfatiza demanda social, a de proteção à participação equilibrada de pais e mães na formação de seus filhos. Por exemplo, a Promotora Rosana Barbosa Cipriano Simão, do Rio de Janeiro, já indicava saídas concretas, no ordenamento jurídico, mesmo antes da Lei nº 12.318/2010, para inibir ou atenuar a alienação parental, porém raramente presentes em decisões judiciais. A nova lei tem por objetivo dar efetividade a essas soluções, além de induzir os operadores do Direito a que examinem com mais cuidado o fenômeno. Constatava-se cegueira do Estado em relação à alienação parental, que tendia a negá-la ou ignorar sua gravidade, identificando-a como mero dissenso passageiro entre ex-casal, sem conseqüências relevantes para a formação psíquica da criança ou adolescente.



Não se pode ignorar, também, que falta estrutura ao Judiciário para lidar adequadamente com essas questões: por exemplo, sobrecarga aos peritos psicólogos, muitas vezes mal remunerados, com tempo insuficiente para examinar, em profundidade, todos os casos que recebem; ausência de investimento em cursos de aprimoramento e formação de equipes especializadas para examinar, por exemplo, as complexas situações em que se busca distinguir alienação parental de suposto abuso contra crianças e adolescentes. Parece saudável que essas dificuldades venham à tona e que pensemos saídas para melhorar a atuação do Judiciário. E nem todas as questões são resolvidas com mais recursos, mas, às vezes, com melhor uso dos que já estão disponíveis.



O Sr. acredita que a guarda compartilhada seja um instrumento contra a alienação parental?



Sim, em muitos casos a guarda compartilhada pode funcionar como inibidor da alienação parental. Um primeiro aspecto é que a ampla convivência da criança ou adolescente com pai e mãe já serve de antídoto contra eventuais atos de alienação parental, pois a criança tem permanente experiência emocional corretiva de eventuais distorções. Além disso, parece que um aspecto importante da guarda compartilhada, do ponto de vista subjetivo, é viabilizar a internalização da noção de que mãe e pai são responsáveis pela formação da criança. Isso também parece ser uma nova referência, um novo critério de organização da dinâmica familiar, do ponto de vista social. Mas também, é necessário observar que, em alguns casos, a alienação parental pode subsistir ou inviabilizar a efetivação da guarda compartilhada; por exemplo, observa-se que, em algumas situações, ocorra sabotagem dessa possibilidade, pelo autor de atos de alienação parental. Nessa hipótese, a intervenção do Estado, por intermédio do Ministério Público e da mão firme do juiz, pode ser decisiva para reorganizar a dinâmica segundo a lei e, portanto, de forma mais saudável.



Qual o principal objetivo da lei, prevenir ou reprimir?



O objetivo principal é o preventivo, em vários graus. A mera existência da lei e a disseminação da noção de que interferir na formação psíquica da criança para que repudie pai ou mãe é forma de abuso, parece contribuir para uma alguma modificação social, nesse sentido preventivo. Além disso, ao estabelecer disciplina mais efetiva para lidar com a alienação parental, a lei dá, não apenas aos operadores do Direito, mas aos Psicólogos e aos mediadores, uma referência legal mais clara, com a qual nos relacionamos, na vida cotidiana. Essa referência legal, por exemplo, pode servir de facilitador da comunicação, em processo de mediação. A lei também permite intervenção para inibir atos de alienação parental, independentemente de conseqüências outras, e dá às autoridades que atuam na proteção dos direitos da criança e do adolescente, referência mais segura para tal. Não é preciso, portanto, esperar conseqüências mais graves (por exemplo, esperar que a criança já esteja respondendo ativamente a uma campanha de descrédito contra um dos genitores) para que haja atuação do Estado, aí compreendendo Conselhos Tutelares, Ministério Público e Judiciário. Além disso, o critério adicional para atribuição de guarda previsto no art. 7º da nova lei, a meu ver, bem aplicado, é um dos instrumentos de maior efetividade para prevenir abusos. Algumas matérias divulgadas na imprensa deram ênfase ao caráter punitivo da lei, o que me parece equívoco; ora, as medidas protetivas previstas na lei, são, basicamente, as que já estavam previstas no art. 129 do ECA, com as adaptações para o fenômeno da alienação parental. Por exemplo, se o estabelecimento de guarda compartilhada, aos olhos do autor de atos de alienação parental, é punição, não o parece ser do ponto de vista da efetiva proteção aos direitos da criança e do adolescente.



Não obstante, para as hipóteses em que a prevenção é ineficaz, parece que as autoridades do Estado devem, de fato, reprimir o abuso. O que parece claro é que a alienação parental levada a efeito é grave abuso que pode trazer relevante prejuízo à formação psíquica de criança ou adolescente. Crianças aparentemente saudáveis, em exame superficial, focado em cuidados básicos e indicadores mais evidentes, podem estar devastadas do ponto de vista psíquico. Embora seja evidentemente mais saudável que os pais reconheçam, no íntimo, a importância da participação de ambos na formação da criança - e há muitos casos em que essa solução é possível-, o Estado não tem a faculdade de fingir que abusos não ocorrem, ou lhes negar importância, quando presentes. Nesse mesmo sentido, a repressão a abuso inevitável corresponde à própria afirmação da lei, em acepção ampla, cuja transmissão também é componente para a saudável formação de criança ou adolescente. Há casos em que a repressão, prudente, por intermédio de sanção, traz resultados imediatos: o autor de atos de alienação diminui a intensidade da violência psicológica contra a criança; a criança, por sua vez, passa a sentir menos o conflito dilacerante e menos culpa por conviver com o outro genitor. O genitor autor dos atos de alienação parental é muitas vezes aquele que, no íntimo, não se dispõe a diálogo, mediação ou tratamento; não percebe e recusa-se a perceber o que faz com o filho.



Por que alienação parental e, não, síndrome de alienação parental?



Em síntese, considera-se que há síndrome, segundo a teoria original norte-americana, quando a criança já responde efetivamente ao processo de alienação parental, contribuindo para que seja aprofundado. Há um debate internacional sobre a natureza do fenômeno e a pertinência de sua classificação como patologia que atinge a criança. Uma das questões é o fato de o conceito de síndrome pressupor única causa, em contraponto a visão sistêmica familiar, que leva em conta as responsabilidades de todos. Não há dúvida de que esse debate, profundo, pode trazer conhecimento importante para melhor abordagem da alienação parental. No entanto, independentemente do exame da eventual responsabilidade de todos os envolvidos, em seus diversos graus, na dinâmica de abuso, o abuso, em si, deve ser inibido ou, na pior hipótese, atenuado.



Uma questão importante que tem sido ignorada é o fato de que a lei brasileira estabelece um conceito jurídico autônomo para os atos de alienação parental, que está no art. 2º da lei, e que não se confunde com a síndrome da alienação parental, embora possamos indicar pontos de contato. O conceito jurídico de atos de alienação parental viabiliza que se reconheça, com clareza, essa modalidade de abuso, em si, independentemente de conseqüências outras. Vale dizer: não é necessário aguardar para saber se a criança responde ou não ao processo abusivo, se há patologia ou não. Caso seja necessária perícia, segundo o art. 5º da nova lei, e essa constate a ocorrência do fenômeno, segundo critério ou nomenclatura científica adequada, esse dado também subsidiará a decisão judicial. Além disso, outro aspecto que considero importante é o fato de que a lei dá ênfase à proteção e não ao debate acerca da nomenclatura ou natureza do fenômeno. O art. 6º da lei, por exemplo, indica as medidas protetivas não apenas para as hipóteses de alienação parental, mas também quando configurada qualquer conduta que dificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, ainda que de natureza diversa. Essa solução, aliás, confirma o traço principal da lei, que não é o de punir, mas de proteger, induzir melhora na dinâmica familiar.



Quais seriam os legitimados ativos para o requerimento a que alude o art. 4º da lei?



O art. 4ª intencionalmente não restringiu os legitimados para o requerimento de reconhecimento da alienação parental. Ao se reconhecer que ato de alienação parental é modalidade de abuso, recupera-se a referência do art. 18 do ECA, no sentido de que é dever de todos zelar pela dignidade da criança e do adolescente. Evidentemente que pais, mães e, por questão de melhor estrutura, os Conselhos Tutelares e o Ministério Público, são os legitimados clássicos para requerer ao juiz o reconhecimento da alienação parental e a adoção de conseqüentes medidas de proteção. Considero, no entanto, que todos que tenham informação consistente sobre essa modalidade de abuso são legitimados, o que pode compreender, por exemplo, familiares, educadores e médicos, que também podem encaminhar casos de abuso aos Conselhos Tutelares e ao Ministério Público.



A aplicação das medidas protetivas previstas no art. 6º da Lei da Alienação Parental dispensam o contraditório, à semelhança do que ocorre no ECA, art. 129, I a VIII?



Exatamente. A natureza dessas intervenções é a de medidas protetivas e não de punição. Em muitos casos, a agilidade do Judiciário é decisiva para inibir o abuso, na origem, ou atenuar seus efeitos. Das medidas previstas no art. 6º da Lei nº 12.318/2010, apenas a do inciso VII, que é a suspensão da autoridade parental, evidentemente aplicável estritamente para hipóteses de alienação parental mais graves, com apoio pericial, pressupõe procedimento contraditório específico, conforme art. 24 do ECA. Isso porque um dos objetivos da lei é o de buscar a melhoria da dinâmica familiar e a efetiva participação de pai e mãe na formação da criança ou adolescente. Outra ferramenta da nova lei é o art. 3º, que, por exemplo, identifica ato de alienação parental a descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes de tutela ou guarda, o que representa infração administrativa definida pelo art. 249 da ECA; esse dispositivo específico tem traço punitivo, mas o sentido é assegurar à criança o exercício regular - em oposição a abusivo - da autoridade parental. Os artigos que estabeleciam crimes foram excluídos do projeto de lei da alienação parental, durante sua tramitação.



Como fazer para que o procedimento incidental para aplicação da lei 12.318/10 não se transforme em outro processo, com a mesma complexidade do processo principal, especialmente se se considerar as especificidades da perícia prevista na lei?



O sentido da lei é mesmo o de viabilizar procedimento ágil, compatível com a gravidade e necessidade de intervenção rápida, em casos de alienação parental. A lei traz esse princípio, induzindo agilidade, inclusive estabelecendo prioridade de tramitação aos processos envolvendo indícios de alienação parental, em seu art. 5º. É necessário empenho dos operadores do Direito para que esse objetivo tenha efetividade. Além disso, é importante dizer que as medidas iniciais de proteção podem e devem ser adotadas independentemente da perícia, segundo o art. 4º da nova lei. Podem, ainda, ser adaptadas, no próprio curso da perícia. A efetiva convivência da criança com os genitores, por exemplo, pode ser viabilizada, de plano, na quase totalidade dos casos, em parâmetros seguros. Em casos mais simples (por exemplo, inviabilização injustificada da convivência regulamentada, hipótese recorrente), a atuação do juiz para inibir a alienação parental independe de perícia (por exemplo, com advertência, multa e ampliação da convivência da criança com o genitor alvo do processo de alienação).



O Sr. entende cabível a aplicação da mediação nos procedimentos regidos pela lei 12.318/10?



Sim, considero que a mediação pode trazer importantes contribuições, em muitos casos. Lamentavelmente, o artigo do projeto de lei da alienação parental que tratava da mediação e tinha por objetivo intensificar sua aplicação foi vetado. Isso, no entanto, não impede que a mediação continue sendo aplicada. As soluções eventualmente decorrentes de processos de mediação são claramente mais consistentes, pois há maior espaço para comunicação e análise das questões efetivamente envolvidas no dissenso; há a possibilidade de construção de saídas conjuntas e com o atributo de compreenderem contribuição pessoal dos envolvidos. É necessário, no entanto, observar que, em algumas situações, principalmente em processos de alienação parental em grau mais grave, a mediação pode se mostrar ineficaz pelo uso do diálogo formal como forma mascarada de transgressão e aprofundamento do processo de alienação parental (por exemplo: retardar a tramitação do processo judicial, burlar acordos prévios ou minar a resistência do genitor alvo do processo).



O Sr. acredita que a interferência extrajudicial do Ministério Público em casos de alienação parental, mediando a restauração do convívio, orientando e alertando as partes para a gravidade da questão, e, enfim, efetivando acordos, pode ser um instrumento eficaz de proteção à integridade psíquica dos menores envolvidos?



Sim, o Ministério Público, com a autoridade que lhe é inerente, é interlocutor privilegiado para essa orientação, quanto à gravidade da alienação parental. Nessa posição destacada, parece que pode induzir dinâmica em que haja a contribuição de todos para a solução do conflito, inclusive a sincera procura pela mediação. A percepção de que a lei tem efetividade contribui para fazer cessar a dinâmica de abuso. A banalização da transgressão da lei, sobretudo em questões envolvendo convivência familiar, contribui para a escalada da violência, pois se chega a situações absurdas em que a transgressão é identificada como meio de exercício efetivo da parentalidade.

Dr. Elizio Perez, sobre a lei da alienação parental
http://www.mp.mg.gov.br/portal/public/interno/arquivo/id/21739