Proposta de matéria sobre descumprimento da Lei pelos magistrados da área de família na Justiça brasileira, inclusive no TJDF.
O Código Civil brasileiro em vigor atualmente, modificado em 2008 pela Lei da guarda compartilhada, dispõe, em seu artigo 1.584, que:
Art. 1.584. A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser:
I – requerida, por consenso, pelo pai e pela mãe, ou por qualquer deles, em ação autônoma de separação, de divórcio, de dissolução de união estável ou em medida cautelar;
II – decretada pelo juiz, em atenção a necessidades específicas do filho, ou em razão da distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe.
§ 1o Na audiência de conciliação, o juiz informará ao pai e à mãe o significado da guarda compartilhada, a sua importância, a similitude de deveres e direitos atribuídos aos genitores e as sanções pelo descumprimento de suas cláusulas.
§ 2o Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, será aplicada, sempre que possível, a guarda compartilhada.
Portanto, não cabe a justificativa que os juízes apresentam para a não aplicação da Lei, qual seja, que não aplicam a guarda compartilhada porque não há acordo/consenso entre os pais. Senão, vejamos:
O artigo 1.584, em seu inciso I, estabelece que a guarda compartilhada poderá ser “requerida por consenso” e, em contraposição, em seu inciso II, estabelece que a guarda compartilhada também poderá ser “decretada pelo juiz”, exatamente “em razão da distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe”.
Ainda no inciso II, em seu parágrafo 2o, a Lei reafirma essa possibilidade, tornando-a imperativa, ao afirmar que “Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, será aplicada, sempre que possível, a guarda compartilhada.”.
Ou seja, observando-se os dois incisos do artigo 1.584 e os dois parágrafos do inciso II, resta inquestionável que o “sempre que possível” pode se referir a qualquer coisa, menos à presença ou ausência de consenso ou acordo, já que a Lei trata explicitamente dessa variável e de como o magistrado deve proceder diante dela: decretando a guarda compartilhada quando não houver acordo entre pai e mãe.
Em suma: segundo o art. 1584 do Código Civil, a guarda compartilhada poderá ser requerida por consenso entre os pais ou, quando não houver acordo entre pai e mãe, isto é, quando pai e mãe estiverem em disputa pela guarda dos filhos, o juiz deverá decretar a guarda compartilhada, em razão da divisão de tempo necessário ao convívio dos filhos com o pai e com a mãe.
Aparentemente a maioria dos magistrados não compreenderam a Lei ou seus motivos e objetivos e não a cumprem. Seguem aplicando o paradigma antigo como sempre fizeram, alegando divergência de interpretação.
Essa “interpretação” que tem sido dada pela maioria dos magistrados – na verdade mero descumprimento da Lei – sequer encontrou respaldo na interpretação que o próprio Superior Tribunal de Justiça - STJ deu para a mesma Lei. Em 2011 o STJ julgou caso embasando sua decisão com extensa doutrina e concluindo que: “Apesar de a separação ou do divórcio usualmente coincidirem com o ápice do distanciamento do antigo casal e com a maior evidenciação das diferenças existentes, o melhor interesse do menor, ainda assim, dita a aplicação da guarda compartilhada como regra, mesmo na hipótese de ausência de consenso.”
Precisamos conscientizar os juízes e acabar com essa preconceituosa injustiça na Justiça brasileira.
Texto de Paulo André Amaral