sábado, 13 de fevereiro de 2010

Casais em divórcios litigiosos se esquecem de ser pais

Estudo da UnB analisa a dinâmica de pais em divórcios destrutivos e como os filhos lidam com a separação

Juliana Braga Repórter da Secretaria de Comunicação da UnB


Pesquisa revela que casais com filhos e que se divorciam litigiosamente se esquecem das suas funções como pais. A dissertação de mestrado Papéis conjugais e parentais na situação de divórcio destrutivo com filhos pequenos, fruto da dissertação de mestrado em Psicologia de Mariana Juras, buscou entender a dinâmica dos pais nesse tipo de divórcio e como os filhos lidam com a situação.
Mariana explica que, como são as mesmas pessoas desempenhando papéis diferentes, o de cônjuge e o de pai, alguns casais podem ter dificuldade em diferenciar essas funções e comprometem o cuidado com os filhos. “Deveria terminar apenas a vida conjugal. O casal precisa continuar se comunicando em função das crianças”, diz. Em separações conflituosas, porém, os envolvidos tendem a priorizar as questões conjugais e chegam a usar os filhos para resolvê-las (veja quadro).
Mariana acompanhou o processo de separação litigiosa de três casais na Vara de Família do Tribunal de Justiça do DF. Realizou uma pesquisa qualitativa a partir de atendimentos no Serviço de Atendimento às Famílias em Processos Cíveis e entrevistas com os pais e filhos. Nesses casos, as crianças tinham entre quatro e onze anos.
FILHOS - As crianças são sensíveis ao conflito e manifestam isso em suas atividades diárias. “Pode se apresentar como um nervosismo, ansiedade ou como uma lealdade muito forte a um dos pais”, exemplifica Juras. Para lidar com a situação, desenvolvem mecanismos, que podem ser saudáveis ou não.
O mecanismo não saudável mais notado foi a parentalização. Como a função dos pais não é exercida adequadamente, a criança sente que precisa se colocar como adulto e tomar decisões. “Por mais que a criança aparente estar bem por conseguir desenvolver suas atividades, ela sofre porque não tem tempo de ser criança”, explica. Quando crescer essa criança tende a ser um profissional competente, uma pessoa que se preocupa com os outros, mas a ausência de uma infância saudável pode causar sofrimento.
Os comportamentos saudáveis identificados foram a mudança de foco e o fortalecimento na relação com os irmãos, quando existem. Uma das crianças analisadas na pesquisa, por exemplo, focou a vida no esporte para evitar lidar com o conflito e para conseguir reconhecimento pessoal. Dedicava-se tanto ao futebol que era um atleta campeão. Nas famílias que tinham mais de um filho, percebeu-se que os irmãos tornaram-se mais próximos, já que se encontram na mesma situação e buscam se ajudar.
DISPUTAS DE PODER - O divórcio é considerado destrutivo quando os cônjuges se agridem, se envolvem em disputas de poder e colocam outras pessoas para intermediar os conflitos. Esse contexto se estabelece quando um dos parceiros ou os dois não conseguem aceitar o fim da relação e, por meio das brigas, tentam manter o outro ainda em suas vida. Nesse tipo de separação é comum que não se reconheça a responsabilidade compartilhada no cuidado dos filhos. “Os pais focam sua atenção apenas na resolução dos problemas com o antigo cônjuge”, esclarece.
Segundo a pesquisadora, um sinal comum de que a separação é problemática acontece quando um dos pais presenteia as crianças com celulares. Dessa forma, falam diretamente com os filhos e passam para eles a responsabilidade de resolver problemas que deveriam ser solucionados entre os pais, como dia de visita. “As crianças não tem responsabilidade sobre essas questões”, afirma Mariana. Sem a intermediação dos pais, os filhos passam a manipulá-los para ganhar presentes ou visitarem um dos pais somente quando quiserem, por exemplo.
De acordo com o IBGE, o número de divórcios aumentou mais de 200% entre 1984 e 2007. Mariana afirma que é um erro acreditar que o aumento represente falência da estrutura familiar. “É sinal de que hoje a sociedade valoriza bons casamentos”, diz.
Diante desse cenário, a pesquisadora defende que é importante conseguir que os divórcios sejam saudáveis. “Mesmo em relações destrutivas, o psicólogo tem que identificar momentos de entendimento e tentar ampliá-los”, defende. Para que isso aconteça, a pesquisadora sugere que quando esses casos cheguem à Justiça, para formalizar a separação, o juiz recomende acompanhamento psicológico. Segundo ela, esses casais não costumam enxergar a importância de resolver seus conflitos e não tomam a iniciativa sozinhos.
JUSTIÇA E PSICOLOGIA - A professora Liana Costa, orientadora da dissertação, explica que a Justiça tem sido cada vez mais procurada para mediar conflitos familiares. E já percebeu a necessidade de interagir com a Psicologia. Reflexo disso é a expansão da Psicologia Jurídica, um dos referenciais teóricos da dissertação. “As decisões judiciais não podem ser mais um elemento de conflito. As duas áreas devem trabalhar juntas para amenizar o sofrimento dos filhos”, justifica.
Mariana Juras esclarece que o trabalho da Justiça e dos psicólogos deve mostrar ao casal que a família não está sendo destruída e sim que se está criando uma nova estrutura familiar. “O divórcio é uma forma de buscar a felicidade”, afirma.


Disponível em http://www.unb. br/noticias/ bcopauta/ index2.php? i=597 Acesso em 12 de fevereiro de 2010.

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